terça-feira, setembro 26, 2017

A História dos ventos

Pedro Soares Martinez tem hoje um artigo no O Diabo que refere o nosso esplendor passado e que segundo ele perdura no presente.
Em suma, os portugueses podem estar orgulhosos dos seus feitos de um passado que só nos honra e enobrece.

Tenho algumas dúvidas que passo a expor, depois de apresentar o escrito:


Segundo se lê,  Portugal iniciou a sua decadência por mor dos efeitos da Reforma. Antes, quem mandava era o Papa e todos os países obedeciam aos mandamentos. Em relação a Portugal ( e Espanha, católica como nós)  havia a posição oficial da Santa Sé em considerar os mares nunca antes navegados como praia nossa, pivativa. Mare Clausum.
Tudo corria bem e Portugal podia explorar as riquezas dos lugares de Além-Mar até que por efeito da Reforma, os países "emergentes" da época se tornaram potências e impuseram o "Mare Liberum" e tudo se foi desmoronando e até a Espanha se virou contra nós.

A nossa descolonização, de facto, começou há séculos e foi imposta de fora pelos efeitos da retirada do proteccionismo da Santa Sé.

Isto é o que se lê, acima.

Porém, pode ler-se outras coisas que não desmentindo a tese de fundo, apara-lhe a simplicidade e acrescenta-lhe outro contexto.

Segundo contam os franceses da revista Historia de Maio de 2010 a influência da Santa Sé era notória e inegável mas o apogeu dessa glória ocorreu no início do séc. XIII. Depois disso foi sempre a cair e até houve dois papas no final do séc XIV ( 1378)  e já no início do séc. XVI o das nossas Descobertas, o Papa foi perseguido pelos luteranos ( Fransberg) e teve que se refugiar.  Depois disso as guerras por causa da Reforma podem justificar tal tese. Em 1800 Napoleão era quem mandava e o Antigo Regime tinha acabado.


Não obstante, a Reforma foi um dos ventos dessa História. Como conta outra revista francesa, L´Histoire, de Maio de 2013, a Alemanha começou  a surgir como potência logo no início do séc. XVI, ou seja aquando das nossas Descobertas.
As "95 teses" de Lutero foram afixadas na porta da igreja de Wittenberg em 31 de Outubro de 1517, faz agora muitos anos numa data redonda.

Mas tal foi o começo da Reforma, a verdade é que a Alemanha já começara a evoluir muito antes para a Modernidade. Até a Cartografia das Descobertas teve ajuda deles...



E nós, nesse tempo o que fizemos? A revista L´Histoire de Abril de 2014, consagrada a Portugal tenta explicar:

Ocupamo-nos do Brasil e do pau-brasil e cana do açúcar, em primeiro lugar. Na altura haveria por aí algumas, poucas,  dezenas de milhar de portugueses, contra mais de dois milhões de índios autóctones. Pouca gente para trabalhar, problema que foi resolvido assim: importação de mão de obra, vinda de Angola. Escrava. Em três séculos ( 1550 a 1850)  calcula-se que  tenham vindo para o Brasil, desse modo, cerca de 4 milhões de escravos, traficados em barcos portugueses.
Primeiro para os "engenhos" do açúcar e depois para a exploração do ouro. Total do ouro trazido do Brasil? Cerca de 876 toneladas. Mais ou menos o que tínhamos guardado no Banco de Portugal, em 1974...




Resultado? Declínio logo no final do séc. XVIII. E não se deveu à Reforma e ao "mare liberum"...


A Alemanha, no mesmo período, viu surgir a sua Renascença e a origem da sua pujança. Porque é que isto sucedeu assim? Por causa da Reforma? Não me parece. Deve haver outros motivos bem mais interessantes.

Que ventos é que sopraram para eles que não quiseram soprar para nós?

214 comentários:

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muja disse...

Eu não quero que confesse nada.

Mas não fui eu que disse que vinha sem grandes certezas...

josé disse...

Eu respondo a essa pergunta: no meu entender o Ultramar, no séc. XX era indefensável a la longue. Por causa do clima internacional que se criou, objectivamente.

E tal começou nos anos a seguir à Guerra Mundial em que não participamos nem tivemos quinhão.

Se as grandes potências quisessem, tinham-nos roubado tudo nos anos da Guerra. E tê-lo-iam feito, com os alemães à cabeça, se tivessem ganho.

Nós teríamos de retirar mais uma vez com o rabo entre as pernas por causa de uma coisa que não me canso de repetir: contra a força não há resistência.

Não houve na Índia e não houve por ocasião do Mapa-cor-de-rosa. Este episódio é elucidativo, aliás.

Nós não tínhamos nem temos poderio militar e só com política de alianças nos safaríamos.

No entanto, por causa da circunstância de Kennedy ter ganho a eleição e ser favoável à descolonização, nem isso teríamos.

Logo, o Ultramar era mesmo indefensável. É esta a minha opinião.

Isso não quer dizer que não desse para aguentar uns anos a guerra de guerrilha, como aconteceu. Mas nunca indefinidamente.

A África do Sul tinha mais legitimidade que nós e perdeu-se. A Rodésia também se perdeu pelos mesmos motivos.

A nossa idiossincrasia histórica nesses casos valeria zero. Como valeu.

muja disse...

Bom, afinal sempre há grandes certezas...



Unknown disse...

Jose,

2 pontos:
Sobre o clima internacional, é certo que Kennedy nos era totalmente adverso. Mas Nixon já era menos. E se resistíssemos mais uns anos, como o Jose refere, Reagan seria ainda mais favorável num contexto de Guerra Fria e conflito com o bloco de Leste.

Sobre a legitimidade d África do Sul, creio que é o oposto. A nossa legitimidade era superior. Não só a nossa presença era anterior, como não havia um regime politico-jurídico construído sobre a discriminação racial.

Miguel D

josé disse...

Nixon foi obrigado a retirar do Vietnam por causa da sua opinião pública.

A Àfrica do Sul tinha mais brancos lá e a mandar, independentes de todos. Mesmo assim, os pretos quiseram a terra para eles e tinham o Mandela. Que foi quem salvou e livrou de uma tragédia, como sucedeu em Angola.

A legitimidade a que me refiro é essa. Não era colónia de ninguém...

joserui disse...

"então que propósito servia todo o palavreado que dirigiam ao mundo?"
Muja, servia e serve para evitar uma outra guerra como a II. E quando o palavreado não vai na direcção que interessa aos fortes, faz-se como se fez no Iraque — que digo-lhe, foi das coisas mais vergonhosas e vagabundas que assisti na minha vida. Teria sido mais decente partir directamente para a destruição do país.

joserui disse...

"Uma delas é a geografia. Outra é a própria natureza humana."
A natureza humana anda pelas ruas da amargura, já a geografia altera-se sim: primeiro, julgo que esta época geológica se chama já oficialmente antropoceno, porque o Homem está a alterar o planeta de forma irreversível, incluindo a geografia; segundo, mudam os interesses geoestratégicos. E isso também mudou e muda a História.

joserui disse...

"E tê-lo-iam feito, com os alemães à cabeça, se tivessem ganho."
Hã? Com base em quê isso José? Em nada. Nunca tivemos problemas com os alemães. Se dissesses ingleses ou americanos, esses nossos grande aliados, aí já me acredito.

joserui disse...

"Nós teríamos de retirar mais uma vez com o rabo entre as pernas por causa de uma coisa que não me canso de repetir: contra a força não há resistência. "
Também não concordo com essa do rabo entre as pernas e é completamente contraditória da opinião que o José tem sobre o Estado Novo e o Portugal da altura: Um país prestigiado no panorama mundial. Hoje é que os borra botas dos angolanos falam mais grosso e este país de invertebrados mete o rabo entre as pernas, a começar nos governos e presidentes. Aliás, vi na diagonal mais uma deste presidente da triste figura. Uma vergonha. Depois querem orgulho nacional, só se for orgulho em baixar as calças.

joserui disse...

Relativamente a manter o ultramar, sim Cabo Verde e S. Tomé, Timor também; dificilmente o resto. por outro lado, suponho que teoricamente o Muja pense que se aguentássemos até 1989 que foi quando caiu o muro, tudo seria possível. São só 15 anos, mas em contexto de guerra é uma eternidade… mais que a duração até então, que serviu para o desgaste que se viu e em última análise para o 25A.

hajapachorra disse...

Ena, tanta senciência. Depois admiram-se com o pan.

josé disse...

Pois...mas palpites sem fundamentação, passo.

zazie disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
zazie disse...

http://observador.pt/videos/conversas-2/tudo-comecou-em-ceuta-ha-600-anos-mas-como-foi-possivel-esquecermos/

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