Era uma vez um indivíduo que se empacota em leituras com
objectivo incerto. Como estudou o “básico”
há mais de 50 anos, apanhou um banho intelectual de “clássicos” greco-latinos
que já tinham infundido respeito aos autores de romances mais antigos, em língua
portuguesa ou a poemas épicos sobre as armas e os barões assinalados.
Esse mergulho primordial no caldeirão classicista legitima-o
como aferidor da sabedoria alheia e distribuidor de galardões de sabichanice.Há mais gente assim, alguns até insuspeitos.
Quem não souber a história de Polifemo é ignorante e quem
ignorar o nome de Tifão será ainda pior
por não conhecer a Odisseia. Afinal saber quem são esses nomeados é tão
importante como enunciar a segunda lei da termodinâmica ou ter aplicado alguma
vez o conhecimento acerca do princípio de Arquimedes que flutua no espaço da
cultura geral.
Em função desta realidade singular o tradutor de literatura
clássica, como Frederico Lourenço, será necessariamente um sábio e aquele
tipo de indivíduos os seus profetas.
E afinal para que servirá toda esta sabedoria de almanaque
clássico? Pois tudo indica que seja para se conhecer mais alguma coisa “sobre a
doença ou a morte, sobre a felicidade e a curiosidade, sobre a esperança e o
destino inelutável, sobre a heroicidade e a cobardia, sobre a traição e a lealdade,
sobre a honra e a vergonha, sobre a intriga, a moda e o sexo”. Quem não leu os
clássicos ficará sempre um passo atrás nessa sabedoria do mundo e das pessoas para quem a realidade será uma quimera ( outra que é preciso conhecer).
Ai do ignorante das figuras cariátides que já perdeu meia
vida nesse olvido involuntário! Até se
ingurgitar das leituras necessárias será sempre um pobre diabo embrutecido à
imagem de um Trump que só poderá
gabar-se das torres de betão e do voto da maioria dos americanos, embrutecidos
de igual modo.
Como é possível sobreviver neste mundo cruel sem conhecer o
cíclope canibal filho de um deus menor?
Como é que se
conseguirá atingir o entendimento das coisas e da realidade à míngua das
categorias da causalidade, necessidade, substancialidade, unidade, pluralidade,
totalidade, realidade, negação, limitação, acidente, existência e
possibilidade, por se desconhecerem os
nomes e feitos fantásticos dos deuses greco-latinos? Dificilmente. As
ideias cosmológicas, psicológicas e teológicas só se apreendem com a leitura
dos clássicos e quem não lê…chapéu!
Ninguém conseguirá apreender e representar totalmente as
coisas de facto existentes sem tal conhecimento…e sem tal instrumento
pedagógico e epistemologicamente garantido. A representação plena da realidade
no nosso espírito só advém das leituras dos clássicos. E mai nada. O verdadeiro
conhecimento aparece depois de lermos os clássicos pois até aí a realidade será
apenas uma sombra cuja forma lhe é emprestada depois. Um Trump vive nas
sombras, naturalmente.
Os Pachecos que leram os clássicos naturalmente acederam à
sabedoria por esse método infalível. A passagem do idealismo ao realismo ocorre
por esse efeito mágico da leitura clássica e como tal deixou de ser obrigatório
nos curricula da educação básica, temos um povo maioritariamente ignorante e populista.
Ai Pacheco, Pacheco!