Miguel Carvalho é um jornalista nascido em 1970 que tem um curso de "radio-jornalismo no Centro de Formação de Jornalistas do Porto" e que escreve na Visão desde 1999, em estilo "grande reportagem".
Um curso de "radio-jornalismo" é quase nada mas o indivíduo tem talento para escrever reportagem e prova-o no livro recente "Quando Portugal ardeu" ( Oficina do Livro) . O autor não escreve em modo insípido e de débito recitativo monótono. Adjectiva bem e verbaliza melhor certos temas e acontecimentos ligados a personagens públicas e vale a pena ler o livro porque prende a atenção do leitor. Tomara muitos repórteres terem metade do talento demonstrado. Deve ser um tipo lido e diversificado nas obras lidas. Deve conhecer Tom Wolfe e o jornalismo gonzo e é assim que gosto de ler.
Neste livro dedica-se ao estudo de um assunto ainda relativamente tabu, aliás como ainda o é o caso de Camilo Mortágua/FP25/PRP/FUP/Otelo/Isabel do Carmo/ Mouta Liz e bombistas de esquerda de vários matizes que mataram gente, também, mas asseguram que foi sempre por boa causa e nunca quiseram fazê-lo .
Miguel Carvalho, herdeiro fatal dessa esquerda über alles dedicou-se ao assunto da "extrema-direita" de 1975 e 1976, a do MDLP e ELP que nem sequer o foi verdadeiramente, mas dá jeito acantonar nesse lado. A objectividade começa logo aí... e continua num erro que na entrevista que concede ao i de hoje denota: Miguel Carvalho acha que afinal o golpe de extrema-esquerda que se temeu no 25 de Novembro foi nada comparado com o golpe de extrema-direita que os factos do seu livro revelam. A prova que encontra para tal reside na circunstância de as bombas terem explodido na sua maior parte, em 1976 e não durante o PREC.
Assim, a frase" "a narrativa oficial diz que estivemos à beira de uma ditadura de esquerda quando estivemos muito mais próximos de um golpe de extrema-direita" é um disparate completo e releva de factos indemonstráveis. Pelo contrário, neste blog tenho acumulado factos e acontecimentos que denotam o contrário.
O ELP e o MDLP não eram forças políticas suficientes para dar o tal golpe temível por uma razão simples: eram até apoiados tacticamente em certa altura por forças políticas organizadas como o PS e o PSD ou o CDS e nunca iria substituir-se aos mesmos, como aliás aconteceu. Ramiro Moreira, o principal activista das bombas do ELP/MDLP, esteve preso três anos, de 1976 a 79. Acabou por fugir para Espanha onde arranjou emprego na Petrogal, empresa pública portuguesa e foi indultado por Mário Soares no Natal de 1991.
A essência do assunto resume-se nisto: os atentados bombistas de 1975-76 ocorreram por "reacção" à tentativa comunista de tomar o poder em 1974 e 75 e que continuou e se ocorreram em 1976 foi porque havia uma Constituição pró-comunista e forças que não tinham sido derrotadas como o provam os atentados comunistas e bombistas das FP25, com o apoio implícito de toda a extrema-esquerda, incluindo o PCP, tacitamente, já nos anos oitenta.
Assim, este livro é sobre a "reacção" ao comunismo que tentou implantar-se em Portugal nos idos de 1974-75 e que teve como protagonistas principais e visíveis algumas pessoas do Norte de Portugal, com destaque para o arciprestado de Braga, acossado no ataque comunista à religião católica e que se defendeu assim com unhas e dentes. E muito bem, até um certo ponto.
É esse ponto que Miguel Carvalho destaca, ao elencar os atentados terroristas praticados nessa altura, em nome do combate ao comunismo e que mataram várias pessoas.
O livro pode ler-se de fio a pavio, mas tem 556 páginas. E pode ler-se por
capítulos porque alguns deles são estanques e contam histórias
singulares. Já li duas: as primeiras, relativamente aos primeiros dos antifassistas-mártires que foram abatidos em frente da sede da Pide/DGS no próprio dia do golpe do 25 de Abril e depois em Agosto de 1974, já pela polícia democrática.
Conta-se a história de quem eram de onde vieram e para onde queriam ir: para a democracia comunista. Um deles, João Arruda tinha vindo dos Açores, da ilha de S. Miguel, para estudar por cá. Ficou por ali, na calçada da rua António Maria Cardoso e o livro conta a história pessoal desse jovem, assim como a de outro que no dia 14 de Agosto de 1974 foi à farmácia e foi apanhado no Rossio, por balas perdidas disparadas pela polícia que pretendia dispersar uma manifestação de apoio ao MPLA...
Outro episódio que vale a pena ler é o do comendador Abílio de Oliveira que era dono da Fiação A Flor do Campo, na localidade de S, Martinho do Campo, paredes meias com a região do mosteiro de Singeverga, em Santo Tirso.
A história do comendador confunde-se com a história de um dos seus empregados rebeldes que o abandonou para apoiar os comunistas locais que que sempre pretendem: apanhar o que é dos outros e custou muito a ganhar, para distribuir pela população dos pobres e explorados.
Este rebelde tinha mulher e filhos e na altura em que dormia em casa, pela calada da noite de 21 de Maio de 1976 rebentou-lhe uma bomba num alpendre por baixo do quarto e matou-lhe a mulher, só não o queimando a ele também porque um dos filhos o salvou in extremis.
O autor do feito foi identificado devido a burrice na execução: deixou que lhe tomassem a matrícula do carro em que se fez transportar e por portas travessas a polícia localizou-o: Ramiro Moreira que se recusou a falar ao autor do livro chamando-lhe "filho da puta" por motivos que saberá melhor explicar. É um dos handicaps do livro porque relata uma história dum lado só: o da investigação criminal efectuada e a dos palpites de circunstantes, com relevo para os familiares das vítimas.
Espera-se que num próximo livro sobre as FP25 também apareçam os relatos das vítimas destes heróis da revolução.
Aliás, segundo o que Ramiro Moreira declarara à época em que foi preso, o atentado em causa significou o fim da aventura bombista. Quem morreu não devia ter morrido, disse...e o mesmo aconteceu anos depois em S. Manços, num atentado das FP25, com uma diferença: neste caso a condescendência é total. Naquele, o ódio continua aceso, como se dá conta no livro.
Ora leia-se uma página sobre esse assunto, para se confirmar que o terrorismo de extrema-esquerda se aparenta mais ao mafioso que nunca dorme nem perdoa: