sexta-feira, dezembro 05, 2014
Este não é o Rio que eu canto...
O ex-autarca do Porto, Rui Rio, putativo candidato a uma liderança do PSD no lugar do actual dirigente, anda em campanha política.
Aproveitando o lançamento de uma biografia ( mas para quê, uma biografia deste político? Fez alguma coisa de extraordinário ou simplesmente notável para a sua história pessoal sair do círculo familiar e amigos?) e esportulou algumas ideias avulsas sobre o que entende pelo Estado de Direito que temos e avançou afoito pelos campos minados da Justiça e da Educação, fazendo rebentar uns engenhos virtuais que o deveriam ter atingido mas ninguém aparentemente reparou nos estragos.
Sobre a Justiça aproveitou o recente caso do recluso 44 para espraiar mais indignação, eventualmente postiça e à boleia da defesa do entalado, sobre a terrível violação de segredo de justiça.
Rio disse: "não posso aceitar esta permanente violação do segredo de justiça. Chamar a comunicação social para assistir a uma detenção e depois continuar a fazer a reportagem e depois pôr peças que estão em segredo de justiça na comunicação social é absolutamente inadmissível".
Sobre a corrupção de políticos e coisas semelhantes que é o problema subjacente, nada de nada.
Vejamos um pouco deste lamento indignado e que já nem é inédito em Rio sobre a famigerada violação do segredo de Justiça.
Sabe Rio se a violação veio de "dentro" e foram os de dentro quem chamou a comunicação social? Não sabe. Supõe. Presume. Ignominia-se com estas presunções à lagardère e faz o figurão da praxe com a postura de político de sistema.
Porém, o que é que se violou de segredo assim tão sagrado para Rio? Que o recluso 44 terá algums milhões postos a bom recato e em nome de outrém? Se foi isso, Rio acharia possível manter tal segredo enquanto a investigação continua com o suspeito preso? Mesmo sabendo isto já vemos o cafarnaum que tal provoca e sem uma crítica de Rio. Se nem isso soubéssems então é que o Estado de Direito seria invocado em habeas corpus diários...
Rio não percebe isto que é tão simples? Acho que percebe mas faz que não percebe para que todos percebam que não percebe e se possa indignar politicamente recolhendo uns votos de centro-esquerda tão preciosos como dignos de registo oportuno.
Por outro lado, indigna-se novamente e em modo postiço com " o espectáculo como aquele que ocorreu com a detenção de Sócrates, porque comentar o julgamento popular é algo que não pode acontecer em democracia". E em ditadura pode? Se calhar é ao contrário. Não será, Rio sem canto?
E já agora que julgamento popular foi esse? Se calhar menos errado em termos de análise de prova que aquele sumário e já com trânsito em julgado que Rio faz da Justiça.
Ao apelar a uma "Justiça mais transparente " que pretende dizer? Que feche tudo em segredos e não os desfaça por nada deste mundo até chegar a mulher da fava rica? Mas então que transparência será essa?
Critica a "sacralização" excessiva,seja lá isso o que for, que nem explicou e temo que nem saiba bem o que seja, para reafirmar logo a seguir que é preciso um ritual e uma sacralização nos poderes, o que se desfaz "quando nós fazemos as coisas chamando a televisão para dar espectáculo" e assim " a respeitabilidade do Estado, a autoridade democrática do Estado é posta na lama".
Pois, mas quem aparece das televisões que são espectáculo em si mesmas porque se destinam a mostrar a grandes audiências, acontecimentos e "eventos" como o que levou Rio à escola onde se formou para dar este triste espectáculo?
Rio parece não entender o funcionamento da Justiça e confunde árvores com florestas; fait-divers com sinais de desagregação sistémica e imputa responsabilidades a quem as não tem.
Rio tem ideias grandiosas para reformar a Justiça, tal como o recluso 44 também tinha e aparentemente pelos mesmíssimos motivos o que se torna estranho e preocupante. O recluso 44 começou o mandato político de executivo de topo anunciando publicamente que iria domesticar a Justiça corrigindo privilégios inadmissíveis. Em privado confessava aos seus que pretendia mesmo "partir a espinha aos magistrados".
Suspeito que Rio pensa o mesmo, mas se assim for que tenha a noção de que quem acabou com a espinhela bem caída foi o agora recluso 44 e não foi por vingança dos visados. Foi porque afinal o sistema de justiça funcionou devidamente, o que Rio parece lamentar...
Um político assim é um perigo para a democracia. Tal como o foi o recluso 44...
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