quarta-feira, dezembro 03, 2014

Quando a esmola é grande até o rico desconfia. Menos certos catedráticos de Coimbra...

Observador:

O “bom princípio geral de uma sociedade que quer ser uma comunidade – comum unidade –, com espírito de entreajuda e solidariedade”. Foi assim que o jurista João Calvão Silva, especialista em direito bancário da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, enquadrou a “liberalidade” no valor de 14 milhões de euros dada pelo construtor José Guilherme a Ricardo Salgado. Esta análise de João Calvão Silva e outra, de Pedro Maia, também da Universidade de Coimbra, foram enviadas por Ricardo Salgado ao Banco de Portugal e levaram o governador Carlos Costa, segundo o próprio, a manter a idoneidade do ex-presidente do BES.
O jornal i publica esta quarta-feira excertos dos dois pareceres jurídicos que Carlos Costa citou, durante a sua audição na Comissão Parlamentar de Inquérito, como documentos que suportaram a sua decisão de manter a idoneidade de Ricardo Salgado e, por essa razão, deixar o banqueiro ao leme do Banco Espírito Santo nos últimos meses de 2013.
Um dos pareceres é de João Calvão Silva, um histórico militante do PSD e, hoje, presidente do conselho de jurisdição do mesmo partido. “A liberalidade foi por conselho dado a título pessoal, fora do exercício de funções e por causa das funções de administrador bancário, não se vê por que razão censurar a sua aceitação, muito menos que possa constituir fator relevante na decisão de registo sob o prisma da idoneidade necessária a uma gestão sã e prudente da instituição de crédito“, escreveu o jurista.
Além de João Calvão Silva, também Pedro Maia, outro jurista da Universidade de Coimbra, não viu razões para questionar a idoneidade de Ricardo Salgado. “Não se vislumbra, sequer em abstrato, em que medida de que forma a aceitação de uma liberalidade no âmbito de uma relação pessoal poderia valer, prospetivamente, como fator que aumentasse o risco ou tornasse até provável que a pessoa não irá, no futuro, efetuar uma gestão sã e prudente do banco”, cita o jornal i.

Esta notícia do Observador de hoje radica na história da "prenda", em termos de fino recorte jurídico qualificada como "liberalidade"  que Ricardo Salgado recebeu de um construtor civil e cujo montante rumou a paragens desconhecidas que se tornaram fonte de problemas fiscais que um qualquer RERT entretanto resolveu, mas uma operação policial repristinou.  
Primeiro eram oito milhões e pico e depois passou a 14 milhões, sem impostos devidamente pagos o que representa uma fraude pela qual a carregueira está à espera.

O gestor de uma empresa que Salgado conhece bem,  Helder Bataglia da Escom, em Agosto deste ano disse o óbvio ululante:
 «O José Guilherme é uma pessoa de grande generosidade, mas acharia estranho receber uma prenda de 14 milhões de euros».

Sobre essa coisa que toda a gente percebe menos os catedráticos de Coimbra, até os Salgados se pronunciaram em reunião de família, para repetirem a evidência: uma prenda tão grande cheira a esturro. Ou segundo o ditado popular...galinha gorda por pouco dinheiro...ou ainda, quando a esmola é grande até o... rico desconfia.




Isto que grita senso comum e revela uma estranheza ululante não o foi de todo  para os catedráticos do Direito de Coimbra, João Calvão da Silva e outros, especialistas em direito bancário e que além do mais, fornecem cursos de pós-graduação a estudantes pós-laborais, com grande predomínio de brasileiros, a troco de propinas generosas, com tudo pago pela Universidade. Os catedráticos foram estimulados pelo Direito bancário e pela promessa de dinheiro a tilintar no bolso,  a emitir parecer a entregar ao regulador que justificasse devidamente a sua natureza corriqueira e normalíssima e fizeram-no com todo o garbo catedrático, salientando "o bom princípio geral de uma sociedade que quer ser uma comunidade – comum unidade –, com espírito de entreajuda e solidariedade”. Gosto particularmente do achado "comum unidade"...e ainda que por causa disso, "não se vê por que razão censurar a sua aceitação, muito menos que possa constituir fator relevante na decisão de registo sob o prisma da idoneidade necessária a uma gestão sã e prudente da instituição de crédito."

Pois não, claro que não se vê.  Apesar de os próprios envolvidos verem muito bem o óbvio, o catedrático não viu.



Calvão da Silva, um jurista de mérito, produziu aquelas afirmações espantosas de alto sentido catedrático e fino recorte jurídico, com um efeito certo: tapar os olhos do regulador do BdP, a troco do estipêndio do parecer. Calvão diz que anda à volta dos 20, 35 mil euros e que por tal paga impostos altíssimos. Pois paga. Já disse também que nada tem a temer sobre a transparência deste processo. Pois não.  Calvão e os catedráticos de Coimbra são muito prendados no saber jurídico e por isso podem atentar contra o senso comum sem perderem a compostura de beca ou afundarem-se no ridículo. A vergonha destas coisas não os atinge, mas será que a têm, quando se olham ao espelho? 

Como agora se percebe, estes pareceres desses catedráticos não custaram 35 mil euros ou até o dobro. Provavelmente custaram milhares de milhões...e embora um parecer seja um parecer,  à falta de melhor o regulador seguiu o parecer. Que é, como na política.

Outra vergonha? Sim, mas respaldada num parecer catedrático.

Questuber! Mais um escândalo!