quinta-feira, fevereiro 18, 2021

Os novos heróis portugueses

 São deste género, como mostra a revista Sábado de hoje, ao dar destaque inusitado, despropositado e incompreensível a uma "indivídua" que defendeu a luta armada, com bombas efectivamente utilizadas,  para colocar Portugal na rota do comunismo semelhante ao do Leste europeu, nos anos setenta e depois.

De facto para a Sábado de Eduardo Dâmaso esta Isabel do Carmo deve ser uma espécie de heroína que combateu o fassismo de Salazar e Caetano. Depois deles saírem pretendia continuar os actos heróicos em prol da chamada democracia avançada. Nela apenas os seus correlegionários teriam direito a assentos parlamentares, dirigidos por uma vanguarda revolucionária composta pelos mesmos e que legislaria, executaria as leis e julgaria as infracções às mesmas, como sucedia nesses regimes. É deste tipo de heróis que estamos a falar e a Sábado evoca com o louvor próprio de quem aceitaria tal sistema, sem grande rebuço ideológico. Alguém acredita verdadeiramente que a "indivídua" mudou de modo de ser ou pensar?

Por outro lado a circunstância de a heroína ter transportado bombas mas não a coragem de as activar é visto como acto heróico digno de apreço, porque afinal só significa que fumou. Mas não inalou...

Enfim, a Sábado está como está: com os ideais de um passado que nunca morre, porque as pessoas não se tornam democratas por mero desejo. É preciso sê-lo,  na sua essência. 



Como reflexo de tal confusão ideológica aparece este artigo do mesmo Eduardo Dâmaso em que se espraia na lição moral habitual sobre a corrupção. Qual é a proposta? 

A corrupção é um mal maior e a sua fonte reside no Estado e no modo como gere os recursos. "Como compra, como distribui competências para comprar, licenciar, adjudicar, emprestar ou, de outro modo, pelos maus exemplos que dá". Para Eduardo Dâmaso isso é corrupção. E será. Mas tem um catch: é corrupção moral e política e os seus reflexos criminais são outra coisa distinta e diversa. 

Juntar ambas as situações e propor remédio radical para ambas é o caminho para a demagogia e a confusão, como se verifica no caso do chico-espertismo das vacinas. Ah! E os "Venturas  nascem destas práticas relativistas"? Não me parece. Nascem, sim,  de outra coisa: do próprio remédio que se propõe, o de radicalizar o combate legal ao fenómeno, criminalizando a eito e sem limite que não o da eficácia.  O radicalismo populista é o método preferido dos Venturas para combater tais males, para além do mais. Ou seja, igualzinho ao proposto. Castrações químicas, penas perpétuas a eito e medidas radicais de solução para problemas sem solução, tal como penalizações criminais para actos de desvio a regras de mera ordenação social, ou nem isso, como seja a manobra para obter vacina sem estar na bicha dos prioritários. 

A única forma de combater e a longo prazo tentar eliminar o modo de ser corrupto, na política e na moral vigente é mudar...de sociedade. Ou então tentar educar de outro modo. Como? Ora, ora...do modo que Eduardo Dâmaso rejeita: ao modo de Salazar, voilà! 

Salazar devia ser um modelo para a educação actual da cidadania. Sim,  actual!  Basta ler o que disse e o que propôs como modo de governar um país e como modo de organizar o Estado e  portanto como este "compra, como distribui competências para comprar, licenciar, adjudicar, emprestar".  E desse modo evitar os   maus exemplos que agora são a esmo. O problema é que evocar Salazar como modelo, nos tempos que correm é anátema certo. E para isso não está Eduardo Dâmaso que precisa de viver como todos nós...

Será que tem alguma dúvida?

No Estado Novo e Social, de Salazar e Caetano havia muitas pequenas corruptelas, dos favores e cunhas que eram socialmente aceites ( por exemplo dar gorjetas a empregados que ganhavam mal, nos sectores privados ajudava a relativizar as gorjetas aos servidores públicos menores que ganhavam ainda pior que aqueles) e tal não impedia que o Estado fosse mais sério e com pessoas mais competentes, sérias, impolutas do que hoje sucede. E que os métodos do Estado para a "compra, como distribui competências para comprar, licenciar, adjudicar, emprestar" fossem mais rigorosos e fundamentalmente muito menos corruptos que hoje em dia. 

Tem alguma dúvida disso?



O mal não é o Ventura. O mal, neste país em que agora vivemos, foi a ascensão ao poder de uma oligarquia partidária e de políticas que fazem do Estado o patrono de tudo e de todos. Ou seja, o socialismo tal como o conhecemos e a social-democracia de país pobre é que  foi a origem do mal e da corrupção moral e política endémicas. 

E tal não se combate com leis criminais. Nunca se combateu. 

Ah! E para evitar confusões não me refiro apenas ao "Deus, Pátria e Autoridade", apesar de Deus ser factor importantíssimo e actualmente ausente do Portugal oficial; da Pátria ser agora apenas algo que se comemora nos campeonatos de futebol e eventos desportivos ou de outras cantorias e fica por aí e a Autoridade ser algo difuso que permite todos os abusos como os que se verificam actualmente na gestão governamental da crise sanitária. 

Não me refiro a isso, apenas, mas ao modo como se educava, nos valores que se promoviam sem desrespeito a outros, na forma como as instituições sociais interagiam, sem o jacobinismo actual e no modo como se legislava sem a profusão diarreica que agora existe. Isso só para dar alguns exemplos. 

Para mudança radical a sério e eficaz, sem ser pelo método criminalizador, poderia começar-se pelo sistema de ensino. 

Para não ser demasiado radical bastaria seguir as ideias de um Nuno Crato, por exemplo e continuar por aí, até termos um sistema que copiasse a essência do que era o antigo, para mim muitíssimo superior ao actual. Nuno Crato, curiosamente,  um radical do MRPP...o que só demonstra que afinal ainda há redenção para espíritos confusos. 

Medida radical concomitante? Mudar a Constituição e submeter as minorias ao império da lei maioritária sufragada pelas maiorias da sociedade civil. Porém, com respeito pelas mesmas minorias, tal como sugeriu o actual presidente do Tribunal Constitucional relativamente aos lobbies...

Sem comentários:

O Público activista e relapso