José Pacheco Pereira tem um livro novo que chamou " As armas de papel". Por causa do livro foi entrevistado pelo Diário de Notícias que hoje publica a converseta.
O livro, segundo o próprio, é uma análise do fenómeno da imprensa de extrema-esquerda nos anos anteriores ao dealbar do 25 de Abril de 1974. Segundo o autor, " a geração que está associada às publicações radicais escrevia muito, tinha uma pulsão por escrever." E tinha um posicionamento político de "repúdio pela acção e a ideologia do PCP, de onde muitos destes fazedores de imprensa clandestina radical vinham ou tinham fugido."
Na entrevista, destaco duas passagens: a primeira sobre a prognose póstuma do que seria o 25 de Abril de 74 sem MFA ou revolução. JPP entende que "se o 25 de Abril não se desse em 1974, haveria duas coisas que iriam suceder: violência e, eventualmente, terrorismo político e uma evolução para fora da linguagem de pau do marxismo, do leninismo e do maoísmo."
Quanto a mim, JPP engana-se redondamente nesta prognose que agora projecta num futuro putativo. Por uma ou duas razões.
A primeira é que em Portugal as luares e movimentos br´s tinham poucos activistas e não podiam fazer propaganda livremente, como acontecia na Alemanha ( com os baader-meinhoff) ou na Itália, com as brigate rosse e outros líricos das armas e bombas na mão e a explodir em praças públicas.
Tal facto aliado à grande competência das forças de segurança numa repressão bem estudada ao longo de anos, chegaria e demoraria apenas um instantinho para que estes líricos da revolução de armas na mão, fossem eliminados do espectro político e social. A prisão por longos anos era o destino fatal e a Revolução não se faria, porque Portugal era um país de brandos costumes, com uma sabedoria que estes líricos sempre desprezaram.
Estes palermas nem percebem que nunca teriam qualquer apoio popular, semelhante sequer ao pequeno apoio que os seus congéneres europeus podiam contar nos países com liberdade de expressão e reunião. A União Soviética e o regime de Leste não caiu pela violência das armas mas desintegrou-se pela incompetência da ideologia. os baader e os brigate rosse mais os ersatz franceses que nem lhes chegavam aos calcanhares da culatra, acabaram pelo mesmo motivo: ausência de amanhãs a cantar e perspectivas de choro permanente.
O que aconteceu nos anos oitenta em Portugal, com as FP25, não pode servir de comparação por isso mesmo: a democracia era mais tolerante com este tipo de facínoras políticos e em particular, a democracia portuguesa tinha muitos dos seus destacados e antigos próceres em lugares de mando militar e político de relevo. Mesmo assim, as FP 25, depois de vários atentados e mortos, foi um ar que se lhes deu, logo que começou a repressão "democrática". Acabaram como organização e alguns deles dedicaram-se à puericultura e à dietética.Mas não abandonaram o pensamento porque não há machado que o corte...e continuam à espera do godot imaginário.
Para além disso, as organizações que perduraram na Europa, durante as décadas seguintes, apenas o conseguiram por serem...nacionalistas úteis que ao mesmo tempo associavam ao agradável esquerdismo. Essa confusão gerou equívocos que se desfizeram depois. Nós não tínhamos qualquer problema nacionalista e por isso, aos nossos revolucionários de papel e ideias de pacotilha a acompanhar , o regime tinha-lhes chamado um figo.
Pacheco Pereira que se perdeu nessa palermice durante anos de adolescência e já idade adulta, nem isso percebe porque quer emprestar um ar de dignidade política revolucionária mínima às infantilidades que defendeu por escrito e na clandestinidade.
Por outro lado, este tipo de fenómeno marginal da sociedade portuguesa do final dos sessenta e início da década que deu o 25 de Abril, tornou-se viveiro de muitos e futuros líderes em vários sectores: media, com dezenas deles a redigirem ( gostavam muito de escrever, diz o JPP...) notícias, outros a fundarem e mandarem em media, política, sector que nem é preciso mencionar porque são mais que as mães da invenção e até negócios empresariais, na "gestão" e naturalmente ensino, um viveiro natural para estes abencerragens vicejarem.
JPP refere isso mesmo: " é desta geração que a maioria destas pessoas vai para os partidos do mainstream: muita gente para o PS e o PSD, praticamente nenhuma para o CDS, pouca para o PCP, e os independentes de esquerda, que andaram pelo MES, vão para o Bloco de Esquerda."
Para além de gostar de saber o que são "independentes de Esquerda", como sinal identitário dos MES, é notável que JPP tenha a noção que "praticamente nenhum foi para o CDS". Porquê?
Por uma razão que explica o que somos: dominados totalmente pela ideologia esquerdista, algumas vezes recalcada, como é o caso de JPP, de uma Esquerda lírica, apalermada na ideologia maoista e quejandas, como a da Albânia ou Roménia e destruidora, portanto eminentemente jacobina, da nossa tradição e costumes ancestrais.
É isto que temos hoje em dia espalhado pelos media e é isto que explica o fascínio basbaque com o funeral do Chavez ou a presença permanente em todos os telejornais de todas as estações televisivas daqueles próceres da tal "esquerda independente" e bloquistas em geral que malham sempre no actual governo como em centeio verde, para gáudio das anas lourenços e quejandos repórteres que já enjoam. Arre! Já chega! É esta a expressão mais sintomática da nossa miséria e é isto que nos conduziu a duas bancarrotas, com vista para uma terceira.
Lendo esta parte da entrevista de JPP ao DN de hoje percebe-se melhor o logro e o poço em que caimos...