Escritórios de advogados e expansão do capital monopolista
O conceito sistema de poder, se analisado ao nível de um país como
Portugal, traduz-se em muitos e diversos intervenientes, com diferentes
perspectivas e diferente dimensão interventiva. Ora, na presente fase da
vida nacional, marcada por uma feroz tentativa de expansão do domínio
do capital monopolista, nacional e internacional, e pelo consequente
aprofundamento da exploração dos trabalhadores, é relevante perceber o
papel dos escritórios de advogados enquanto intervenientes do sistema de
poder ao serviço – de forma directa ou indirecta – do capital
monopolista.
Os maiores intervenientes
À semelhança do sucedido com outras actividades económicas, em Portugal marcam presença – nalguns casos, bastante activa – as sociedades internacionais de advogados, algumas de âmbito mundial. Exemplo das mesmas é o histórico escritório Linklaters (remonta ao século XIX), sediado em Londres, que recentemente assumiu protagonismo significativo ao ser escolhido para prestar assessoria jurídica no processo de alienação de capital público existente na EDP e na REN e na oferta pública de aquisição (OPA) da CIMPOR.Contudo, o panorama nacional da advocacia é claramente dominado por entidades portuguesas, com destaque para as sociedades de advogados, eventualmente em associação com entidades congéneres externas ao País. As sete maiores sociedades integram, cada uma delas, mais de uma centena de advogados (entre sócios, associados e estagiários), sendo de salientar o escritório A. M. Pereira, Sáragga Leal, Oliveira Martins, Júdice & Associados, visto ultrapassar os duzentos advogados (ver Quadro 1).
Quadro 1
Sociedade de Advogados | Nº de advogados |
---|---|
A. M. Pereira, Sáragga Leal, Oliveira Martins, Júdice & Associados |
220
|
Miranda Correia Amendoeira & Associados |
173
|
Abreu & Associados |
165
|
Vieira de Almeida & Associados |
164
|
Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados |
160
|
Cuatrecasas, Gonçalves Pereira |
140
|
Sociedade Rebelo de Sousa & Advogados Associados |
110
|
Fonte: In-Lex – Anuário das Sociedades de Advogados, 2012 (sítio na Internet).
O volume de negócios acompanha, aproximadamente, a dimensão em recursos humanos. Assim, por exemplo, o escritório Abreu & Associados, mencionado no Quadro 1, informa ter um volume de negócios anual de 15 milhões de euros (1), o que o classifica como uma média empresa de acordo com os critérios vigentes na União Europeia. Isso significa um volume de negócios anual médio de cerca de € 115.400,00 por advogado (excluindo do cálculo os advogados estagiários) (2).
Advogados na superstrutura política e ideológica
Em algumas sociedades de advogados, com destaque para as maiores, pontificam figuras de topo dos partidos políticos integrantes da «troika vende-Pátria» e personalidades claramente afectas a este leque partidário, com destaque para o PSD (ver Quadro 2).
Quadro 2
Sociedades de Advogados |
Advogados (sócios, associados ou consultores) |
---|---|
A. M. Pereira, Sáragga Leal, Oliveira Martins, Júdice & Associados | Manuel Cavaleiro Brandão, Rui Machete, José Miguel Júdice |
Abreu & Associados | Luís Marques Mendes, Paulo Teixeira Pinto |
Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados | José Manuel Galvão Teles, António Lobo Xavier |
Cuatrecasas, Gonçalves Pereira | André Gonçalves Pereira |
Sociedade Rebelo de Sousa & Advogados Associados | Pedro Rebelo de Sousa, Manuel Lopes Porto |
Uría Menéndez-Proença de Carvalho | Daniel Proença de Carvalho |
Rui Pena, Arnaut & Associados | Rui Pena |
Correia, Seara, Caldas, Simões e Associados | Fernando Seara, Júlio Castro Caldas |
José Pedro Aguiar-Branco & Associados | José Pedro Aguiar-Branco |
APORT – Advogados Portugueses em Consórcio | Sílvio Cervan |
Fonte: Sítios das sociedades de advogados na Internet, 2012.
A ligação entre advogados e partidos políticos tem a sua continuidade na ligação daqueles aos órgãos do poder político. Efectivamente, basta atentar na quase totalidade dos nomes mencionados no Quadro 2 para reconhecer a ligação indelével dos mesmos, presente ou passada, à Assembleia da República, ao Governo, a assembleias e executivos municipais.Como seria de esperar, as ligações supra estendem-se ao aparelho de Estado. Efectivamente, advogados com nomes sonantes têm sido alvos constantes de nomeações para estruturas, permanentes ou temporárias, no âmbito do Sector Público Administrativo e para o Sector Empresarial do Estado. A título meramente exemplificativo, apresentamos os seguintes casos entre os nomes referidos no Quadro 2 (3):
- Rui Machete foi administrador do Banco de Portugal e é vice-presidente da Mesa da Assembleia Geral da Caixa Geral de Depósitos;
- Manuel Lopes Porto foi membro da Comissão de Reforma Fiscal e é presidente da Mesa da Assembleia Geral da Caixa Geral de Depósitos;
- Daniel Proença de Carvalho foi presidente do Conselho de Administração da RTP;
- Pedro Rebelo de Sousa é vogal do Conselho de Administração da Caixa Geral de Depósitos.
É igualmente visível a influência de membros das sociedades de advogados a nível do aparelho ideológico. A este respeito, sem prejuízo de considerações mais rebuscadas que se podem – e devem – tecer sobre o carácter ideológico da intervenção desses membros enquanto docentes universitários e conferencistas, resulta clara a sua intervenção conformadora da opinião pública na qualidade de comentadores, episódicos ou permanentes, nos órgãos de comunicação social. Por exemplo, quem não foi ainda confrontado com os comentários na comunicação social de José Miguel Júdice ou de António Lobo Xavier?
Advogados, grupos económicos capitalistas e negócios
A teia completa-se com a ligação das sociedades de advogados aos grandes grupos económicos capitalistas. Procurámos demonstrar essa ligação averiguando qual a presença dos nomes enunciados no Quadro 2 nos órgãos sociais de um conjunto relevante de empresas e grupos económicos referenciados no Quadro 3.Quadro 3
Sector de Actividade | Empresas e Grupos Económicos |
---|---|
Fabricação de pasta celulósica, de papel e de cartão | PORTUCEL-SOPORCEL |
Fabricação de cimento | CIMPOR |
Produção e distribuição de energia | GALP Energia, EDP |
Construção | Mota-Engil, Soares da Costa |
Comércio | Jerónimo Martins |
Transportes | BRISA |
Informação e comunicação | Portugal Telecom, ZON, IMPRESA |
Actividades financeiras e seguros | BES, Millennium/BCP, BPI, BANIF, Santander Totta, Tranquilidade, Millenniumbcp Ageas Grupo Segurador |
Diversos | SONAE |
Quadro 4
Advogados | Empresas | Órgãos Sociais |
---|---|---|
Manuel Cavaleiro Brandão | SONAE, SGPS | Presidente da Mesa da Assembleia Geral |
BPI | Vice-presidente da Mesa da Assembleia Geral | |
Rui Machete (consultor) | Millenniumbcp Ageas Grupo Segurador | Presidente da Mesa da Assembleia Geral |
Daniel Proença de Carvalho | GALP Energia | Presidente da Mesa da Assembleia Geral |
ZON | Presidente do Conselho de Administração | |
BES | Vogal da Comissão de Remunerações | |
José Manuel Galvão Teles | EDP | Presidente da Comissão de Vencimentos |
IMPRESA | Vogal do Conselho de Administração | |
Millennium/BCP | Vogal do Conselho de Remunerações e Previdência | |
António Lobo Xavier | Mota-Engil | Vogal do Conselho de Administração |
SONAECOM | Vogal do Conselho de Administração | |
BPI | Vogal do Conselho de Administração + Vogal da Comissão de Governo | |
Rui Pena | EDP | Presidente da Mesa da Assembleia Geral + Vogal do Conselho Geral |
Paulo Teixeira Pinto (consultor) | EDP | Vogal do Conselho Geral |
José Pedro Aguiar-Branco (4) | PORTUCEL-SOPORCEL | Presidente da Mesa da Assembleia Geral |
IMPRESA | Presidente da Mesa da Assembleia Geral + Presidente da Comissão de Remunerações | |
Júlio Castro Caldas | Soares da Costa | Presidente do Conselho Fiscal |
ZON | Presidente da Mesa da Assembleia Geral |
Fonte: Sítios das empresas na Internet, 2012.
A título de curiosidade justifica-se referir que, fora do universo empresarial aqui considerado, Daniel Proença de Carvalho tem a presidência da mesa da assembleia geral numa quantidade significativa de empresas, tudo indicando que seja o «recordista nacional» (ou próximo disso) neste tipo de actividade (5).Em termos de áreas de negócio, merece destaque a participação dos escritórios mencionados no Quadro 2 nos processos de privatização daquilo que resta do Sector Empresarial do Estado. Considerando apenas exemplos recentes, as sociedades A. M. Pereira, Sáragga Leal, Oliveira Martins, Júdice & Associados e Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados prestaram assessoria nos processos de alienação do capital público existente na EDP e na REN. O segundo escritório mencionado prestou até dupla assessoria no processo da EDP: à administração desta empresa e ao Estado.
Negócios afins são os da fusão de empresas e da transacção de partes de capital de empresas, na gíria económica titulados como fusões & aquisições, onde também pontificam as sociedades de advogados na qualidade de assessores jurídicos. Note-se como na recente oferta pública de aquisição (OPA) da CIMPOR o escritório Uría Menéndez-Proença de Carvalho surgiu como assessor de um potencial adquirente – o grupo económico brasileiro Camargo Corrêa.
Outra área de negócio que os dirigentes dos escritórios parecem considerar promissora é a intervenção externa, nomeadamente por via da ligação a escritórios de advogados em países de língua oficial portuguesa. O Quadro 5 é revelador dessas ligações internacionais personalizadas.
Quadro 5
Sociedades | Países onde existem ligações personalizadas |
---|---|
A. M. Pereira, Sáragga Leal, Oliveira Martins, Júdice & Associados | Angola, Moçambique, Brasil, República Popular da China |
Abreu & Associados | Angola, Moçambique |
Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados | Angola, Moçambique, Brasil, República Popular da China |
Cuatrecasas, Gonçalves Pereira | O número de ligações é muito significativo, resultado da associação de Gonçalves Pereira à sociedade de advogados espanhola Cuatrecasas |
Sociedade Rebelo de Sousa & Advogados Associados | Angola, Cabo Verde, Moçambique, Brasil, Reino Unido |
Uría Menéndez-Proença de Carvalho | O número de ligações é muito significativo, resultado da associação de Proença de Carvalho à sociedade de advogados espanhola Uría Menéndez |
Rui Pena, Arnaut & Associados | Angola, Timor, Brasil |
Correia, Seara, Caldas, Simões e Associados | Brasil |
José Aguiar-Branco & Associados | Espanha, França |
APORT – Advogados Portugueses em Consórcio | Espanha |
Fonte: Sítios das sociedades de advogados na Internet, 2012.
Para além de outras considerações pertinentes de carácter imediato, é de salientar que qualquer dos negócios aqui referenciados permite aos escritórios de advogados funcionarem como elos de ligação e instrumentos de expansão dos grupos económicos capitalistas, sejam eles internos ou externos ao País.A associação de interesses entre sociedades de advogados e os grandes grupos económicos capitalistas permite-nos ainda incorporar, no âmbito do presente artigo, uma afirmação inequívoca sobre o estado actual da justiça portuguesa: o seu muito vincado carácter de classe, que se consubstancia no facto de a grande burguesia dispor de avultados meios para fazer valer os seus interesses no foro judicial, em claro detrimento da generalidade da população, seja esta encarada como trabalhadora ou como consumidora.
Conclusão
Com base no que acabou de ser escrito e exemplificado, constata-se a existência de escritórios de advogados que se configuram objectivamente como instrumentos essenciais, directos ou indirectos, da expansão do domínio dos grandes grupos económicos capitalistas: instrumentos directos, devido à ligação entre ambos; instrumentos indirectos, por intermédio da relação escritórios de advogados → instituições da superstrutura política e ideológica (o que até constitui, em termos objectivos, uma porta aberta para o alastramento da corrupção).Nesta qualidade, trata-se de entidades que têm contribuído activamente para a subordinação do poder político democrático ao poder económico; e, portanto, tais entidades constituem mais uma (entre tantas…) excrescência inconstitucional da sociedade portuguesa.
Não serão quaisquer entidades reguladoras a extirpar esta autêntica chaga social, mas sim a ruptura com a política de direita dos partidos da troika, consubstanciada essencialmente na ruptura com o domínio dos grandes grupos económicos capitalistas (internos e externos ao País), da qual resulte a implementação de uma política alternativa que reconstrua Portugal com base nos valores de Abril. Enfim, uma política visando o socialismo.
Notas:
(1) http://www.bcsdportugal.org/abreu-e-associados---sociedade-de-advogados/1344.htm(2) In-Lex – Anuário das Sociedades de Advogados, 2012 (sítio na Internet).
(3) Dados obtidos a partir dos curricula e do sítio da CGD na Internet.
(4) José Pedro Aguiar-Branco declara no seu curriculum vitae ter terminado as funções mencionadas aquando da tomada de posse como Ministro.
(5) http://www.zon.pt/institucional/PT/Assembleia-Geral/2009April/Documents/Anexo%20Ponto%204_FINAL.pdf
20 comentários:
conheci vagamente alguns deles durante a minha actividade profissional.
a meu ver faltam alguns ligados ao ps que também conheci.
outros estarão na sombra.
consta que são 'ligações perigosas' para os contribuintes
porque 'estão no meio de tudo'
os 'descamisados' todos juntos devem auferir os mesmos honorários
a Troica ainda não atacou este sector?
estive a ouvir Zeca nos Vampiros «eles comem tudo ...»
"Advogados na superstrutura política e ideológica"
aahhahaha
Mas onde é que o José desencantou esta anormalidade marxista?
No O Militante. Estes fósseis sonham a preto e branco, ainda.
"o que até constitui, em termos objectivos, "
eheheh Em termos objectivos. Mas isto é a K7 fossilizada.
Quem foi o fóssil, José?
":O)))))
http://www.omilitante.pcp.pt/pt/319/Economia/717/
Isto é incrível.
Victor Paulo Gomes da Silva.
Estou parva. Fiz pesquisa e dei com ele.
O Militante do Avante
ahahahahahah
Que idade terá o tal Victor Paulo que escreveu isto- devia estar a fazer tijolo.
O mais terrível nem é isso, é poder ser novo.
É capaz de ser este contabilista fossilizado.
Eu não disse! e aparece nos Anonymous da Linha de Sintra.
Os tais anarcas das manifs à Guy Fawkes
E pior ainda, vi que um sujeito por quem tenho até admiração e que já recomendei como ser dos raros que sabe o que diz, ao contrário dos "críticos de arte" que nem sabem o que fazem, também é "amigo" dos que citam esta porcaria.
José, o José tem razão. Portugal levou uma lavagem cerebral da escardalhada e é este o discurso besta até de gente que tinha obrigação de o não ser.
Será este da Aberta?
http://www.degois.pt/visualizador/curriculum.jsp?key=0016425744012194
Já lá tinha chegado e tudo indica que sim.
Fóssil mais fóssil não pode haver.
É ele. 57 anos- um contabilista do Seixal, que foi a Doutor pela Aberta
http://www.cieo.ualg.pt/INV/74/cv74.pdf
Exacto, vimos ao memso tempo.
E veja como também andou pelas ciências da educação em micro curso numa politécnica de Madrid
Viu o curriculo?
Antes dos 40 anos só fez umas coisas em África.
ehehehhe
É um artur batista da silva Victor.
Pois é
":O)))))
E também é muito citado.
Há doutores de Coimbra e doutores de imbra (os que foram à aberta e deram a primeira sílaba), Homem Christo Filho dixit.
Bom post, José!
Não dei pelo socialista António Vitorino no rol.
Portugal não vai a lado nenhum com o Tarrafal fechado.
Que engraçado. Ninguém percebeu o post
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