quinta-feira, abril 30, 2015

A arquitectura de Salazar e a Reboleira

Na semana passada morreu João Pimenta, o dono da empresa J.Pimenta ( "pois, pois...J.Pimenta!", slogan publicitário de que muitos ainda se lembram) que nos anos setenta revolucionou de algum modo a construção de casas- andares- em altura nos arrabaldes de Lisboa. Parece haver quem pretenda assacar a este "pato bravo" ( porque vindo dos lados de Abrantes) a responsabilidade pela descaracterização de uma paisagem que de outro modo seria idílica e a par junta-se-lhe Marcello Caetano, outro "pato-bravo" para os salazaristas mais salazaristas que Salazar.

Ora as construções em altura e as arquitecturas que as permitiram não começaram com Marcello Caetano, mas vinham de trás, do tempo de Salazar e seus ministros. Salazar, aliás, em matéria estética seria por assim dizer, indiferente a qualquer coisa que ultrapassasse a sobriedade a que estava habituado. No artigo que já citei, da revista Resistência, conta-se que na residência oficial que passou a ocupar na rua da Imprensa, apareceu o arquitecto Raul Lino, encarregado pelos serviços do Ministério das Obras Públicas para decorara residência. Salazar ter-lhe-á dito: "deixo isso ao seu gosto. Arranje como lhe parecer melhor". E assim foi.
Portanto, havia uma estética na arquitectura e urbanismo no tempo de Salazar antigo. O tempo passou e nos anos sessenta modificou-se. Salazar pode não ter sido visto nem achado na mudança, atenta aquela ausência de preferências estéticas, mas foi ainda no seu tempo que tal sucedeu.

A prova está aqui nestes recortes de revistas antigas que servem sempre para este efeito: mostrar a manipulação quando tal é notório.

Flama, 12 de Maio de 1967




Século Ilustrado, Março de 1968.



Século Ilustrado, 1969



E porque razões apareceram estas construções em altura, em bairros para o efeito?

O  melhor é ouvir o decano dos arquitectos salazaristas, Raul Lino, em entrevista à Flama de 4 de Dezembro de 1970: o tempo passou.



Em 1969 havia um projecto para a reformulação do que é actualmente o Parque Eduardo VII. Assim, como mostra a Flama de 6 de Junho de 1969:





Estes projectos não se gizavam em dois tempos e eram fruto de maturação de arquitectos e planeadores do regime.
Compreende-se que haja quem pretenda vilipendiar Marcello Caetano  atribuindo-lhe males de que não é responsável directo. Fazê-lo em nome de uma pureza de pensamento e princípios atribuíveis a um Salazar mítico que até na arquitectura e arranjo urbano se manifestava,  é que parece um pouco exagerado, para dizer o menos.

Questuber! Mais um escândalo!