i de hoje, que no interior recenseia meia dúzia de passagens de acórdãos destinados a um objectivo não declarado mas inequívoco: deslegitimar o poder judicial. A razão não é difícil de descortinar: preparar o terreno mediático para o que aí virá.
Público de hoje, com reportagem sobre o que aconteceu ontem no TRP, em que os representantes do poder judicial, presentes, incluindo o presidente do STJ falaram claramente sobre o acórdão em causa procurando hipocritamente distanciar-se do seu teor.
A maior barbaridade em que aquelas senhorias incorreram é colar o teor do acórdão a passagens que não significam exactamente o que se lhes procura atribuir, ou seja que a decisão da Relação foi tomada pelos desembargadores em função de preconceitos ultrapassados e desajustados à lei e à Constituição actuais.
Os jornais de hoje descobriram que afinal o artigo fatal do Código Penal de 1886 estava revogado expressamente desde 1975. E de facto, assim acontece...
Mas a questão essencial não bem essa. É a relevância de um acto de adultério, no caso da mulher, mas poderia ser do homem, para provocar alterações no estado físico e psíquico de alguém que depois de assim ficar comete actos de violência doméstica. E nisso, deveriam estes jornalzecos pesquisar melhor porque nem era preciso ir muito mais longe que alguns cliques no Google:
I - E de rejeitar a interpretação segundo
a qual o Decreto-Lei n. 262/75, de 27 de Maio, ao revogar o artigo 372
do Codigo Penal, tenha querido privar o homem casado do beneficio da
atenuante modificativa da provocação prevista na parte especial do
Codigo Penal, se achar a sua mulher em adulterio.
II - Independentemente do valor que se deva atribuir ao relatorio que
precede o citado Decreto-Lei, nele pretendeu-se justificar a revogação
do artigo 372 do Codigo Penal, e so isso.
III - Alias, nesse relatorio não se pretendeu, nem razoavelmente o
deveria fazer, justificar a impossibilidade de as pessoas referidas no
artigo 372 beneficiarem da atenuante especial do artigo 370 do Codigo
Penal.
IV - Pretendeu-se, sim, que o adulterio da mulher e do marido, bem como a
corrupção de menores não tivesse, nos termos do artigo 372, uma função
alargadora do conceito de provocação, formalmente limitado pelo artigo
370.
V - As palavras daquele relatorio são esclarecedoras. Nele se diz...
"porque o artigo 372 abstrai inteiramente da verificação da emoção
violenta que aos agentes podem eventualmente produzir tais factos,
confere um autentico "direito de matar". Ha que por termo a semelhante
aberração, certo como e que, se por parte dos que pratiquem tais factos
existir um choque emocional que os leve a violencia, eles tem o seu
enquadramento na parte geral daquele diploma (Codigo Penal).
VI - O que se pretendeu foi evitar que, "sem emoção violenta" "que o
leve a violencia" e com serenidade o reu beneficiasse da provocação
constituida por adulterio ou corrupção de filha menor e da punição
simbolica - desterro para fora da comarca por seis meses - prevista no
artigo 372, o que conferia, como expressamente se le no relatorio do
aludido decreto-lei, um autentico "direito de matar".
VII - Quer dizer, com a revogação do artigo 372 desapareceu a referida
função alargadora do conceito de provocação formalmente limitado pelo
artigo 370, pelo que os reus, nos casos previstos naquela disposição, so
beneficiam da atenuante modificativa da provocação se se verificarem os
elementos dela, como em qualquer outro crime doloso de homicidio ou de
ofensas corporais. Ficam, pois, sujeitos ao regime geral, não gozando do
regime especial ou especialissimo estabelecido no artigo 372.
VIII - A tal conclusão era de chegar, mesmo que o artigo 39, n. 4 , ao
considerar a provocação como atenuante, não referisse o artigo 370,
quando diz que pode a provocação, consistente em ofensa directa a honra
da pessoa, ser considerada como violencia grave para efeitos deste
artigo. E isto sob pena de se passar de uma solução obsoleta e injusta
como era a consagrada no artigo 372 para outra tambem injusta, como o
seria a da impossibilidade legal de aplicar o artigo 370, quando a
ofensa grave produtora da emoção violenta que afectasse as faculdades
mentais, fosse o adulterio.
IX - O Estado reconhece a constituição da familia e assegura a sua
protecção - artigo 67 - e a todos e reconhecido o direito ao bom nome -
artigo 33, ambos da Constituição da Republica.
X - Os conjuges estão reciprocamente vinculados pelos deveres, alem de
outros, de respeito e fidelidade - artigo 1672 do Codigo Civil. A
violação desses deveres pode constituir fundamento de divorcio - artigos
1773 e 1779 do mesmo diploma, atingindo ou podendo atingir gravemente a
familia.
XI - Quando um conjuge tem relações sexuais com outra pessoa que não
seja o seu conjuge, não e fiel e, violando esse dever, comete o
adulterio, que constitui a mais grave das formas de violação do dever
reciproco de fidelidade que vincula os conjuges.
XII - O adulterio e considerado ainda em certas condições, em face da
nossa lei, um facto ilicito criminal, punido nos termos dos artigos 401 e
404 do Codigo Penal, com as modificações introduzidas pelo artigo 61 da
Lei do Divorcio.
XIII - Não se ignora que o adulterio tem perdido a sua dignidade
criminal, deixando de ser considerado infracção criminal e, como tal,
sancionado. E isso aconteceria entre nos se o projecto do Codigo Penal
passasse a ser lei, sem alterações. Por enquanto, o adulterio ainda e,
em certas condições, ilicito penal da nossa lei.
XIV - Quando da revogação do artigo 372 podiam ter tido a mesma sorte os
artigos 401 e 404 e 61 citados, e estes não foram revogados.
Este acórdão é de 1980, claro. Mas o Código Penal que revogou aqueles artigos 401 e 404º foi aprovado apenas dois anos a seguir. Até lá...estes considerandos do STJ eram válidos, como continuam a ser nos dias de hoje:
"Quando um conjuge tem relações sexuais com outra pessoa que não
seja o seu conjuge, não e fiel e, violando esse dever, comete o
adulterio, que constitui a mais grave das formas de violação do dever
reciproco de fidelidade que vincula os conjuges."
Isto ainda hoje não foi revogado...e foi isto que o desembargador Neto, de modo canhestro quis afirmar. E bem.
De resto vou colocar aqui outra referência de carácter pedagógico, muito recente, de um magistrado de tribunal superior que se pronunciou sobre o...namoro.
Para quem, como o presidente do STJ, anda agora a pedir contenção nas citações que os juízes fazem, este apelo à sociologia de algibeira não está nada mal...é o pior é que a este, o presidente do STJ não diz nada pela certa. Ai não diz, não. Logo digo quem foi que escreveu isto, se calhar e for preciso.
ADITAMENTO:
Nestes dias em que comentei o acórdão do juiz da Relação do Porto não lhe citei o nome uma única vez, penso. Não é preciso porque o assunto é de outra natureza que não a pessoal. Aliás não conheço a pessoa em causa.
Porém, o Público já lhe fez um retrato em fotomaton e agora repisa-se a mesma tecla do caso pessoalizado. O juiz em causa está tramado, com este jornalismo de sarjeta assinado por Rita Cipriano. Onde é que aprendeu a fazer isto? Na escola de jornalismo dos que não sabem o que é um jornalismo decente e isento?
20 comentários:
a doudeira generalizou-se em rilhafoles do antónio das mortes
até os supremos de frango fazem parte do cuzinhado
ehehehe
Quem terá sido
O tal blog que chamou jumento ao Presidente da República, hoje aventura-se com pérolas sobre as indemnizações e o direito de igualdade que diz deve ser o mais importante da Constituição, soa a coisa de spin do Largo do Rato http://jumento.blogspot.pt/2017/10/as-indemnizacoes-e-o-principio-da.html#disqus_thread
proponho que a robotização das sentenças dos magistrados, diagnósticos médicos. merdidas políticas deste GULAG social-fascista
seja dirigida por comichão da desigualdade do género
cujos pruridos em variados locais devem ser tratados com anti-fúngico sistémico
caso contrário todos temos direito a ter pé de atleta
"Quando um conjuge tem relações sexuais com outra pessoa que não seja o seu conjuge, não e fiel e, violando esse dever, comete o adulterio, que constitui a mais grave das formas de violação do dever reciproco de fidelidade que vincula os conjuges."
"Isto ainda hoje não foi revogado...e foi isto que o desembargador Neto, de modo canhestro quis afirmar. E bem."
Isto ainda não foi revogado mas não se lhe atribuem os efeitos sancionatórios que parece almejar, subsistindo apenas, direito a indemnização nos termos gerais da responsabilidade civil.
"Isto ainda não foi revogado mas não se lhe atribuem os efeitos sancionatórios que parece almejar, subsistindo apenas, direito a indemnização nos termos gerais da responsabilidade civil."
Não foram elencados "efeitos sancionatórios" na decisão da Relação do Porto por causa disso.
Foram apenas considerados os efeitos que tiveram na saúde física e psíquica do arguido e tais efeitos foram fixados na primeira instância, não tendo sido remexidos na Relação.
É preciso entender isso para se compreender todo o acórdão.
"Quem terá sido"?
Foi um juiz do STJ, em 20.9.2017, portanto bem fresquinho. E contrariou a tese do MºPº no mesmo STJ que entendeu o namoro de modo menos "sociológico".
Este acórdão do STJ é um escândalo por isso e se as pessoas soubessem do que se trata fariam maior escandaleira ainda.
No entanto, aposto que nem vão tocar no assunto.
Essa frase serviu para retirar cinco anos de prisão a um homicida psicopata, declarado como tal no relatório psiquiátrico no processo.
Quando saiu da cadeia vai matar mais pessoas ( mulheres, no caso).
Quando sair, quero dizer. Em 2031.
C'um caraças
Disso não se lembram de tornar público.
"...constitui a mais grave das formas de violação do dever reciproco de fidelidade que vincula os conjuges."
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Não será a mais grave, mas é motivo para divórcio. Não é atenuante para agressões físicas e sequestro.
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Aliás, o facto do marido cometer o crime de sequestro e maus tratos só vem atenuar, isso sim, a gravidade da infidelidade da mulher. Afinal de contas a mulher procurou conforto noutro homem porque o marido era uma besta certamente.
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O juiz mto provavelmente julgou em causa própria, como se fosse ele o cornudo.
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Ora, é elementar, um juiz não pode julgar desse modo. Não pode julgar colocando-me na pele dos ofendidos. Tem apenas que aplicar as leis.
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Se assim não fosse a justiça e o justiceirismo confundia-se.
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Se eu me colocar na pele dum pai que mata o assassino da sua filha e fosse juiz libertava o o pai. Um juiz não pode nem o deve fazer. Deve ser imparcial. Senão não há regras. Há justiça pelas próprias mãos.
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Rb
Pois não e se lhe dissesse quem são os subscritores de tal acórdão do STJ e a fundamentação completa que nem é assim extensa, ficaria algo surpreendida.
Um deles foi do MºPº até aqui há uns anos e foi vilipendiado na praça pública por causa de certas coisas ligadas a processos mediáticos.
E é bom magistrado e já foi governante. Mas isto é mesmo assim: é preciso entrar no sistema para entender certas coisas e não se pode julgar tudo na base do palpite avulso sem compreender certas realidades.
Este linchamento mediático do juiz do Porto é uma grande, grande vergonha, mas se forem perguntar a esse tal magistrado o que pensa do assunto, aposto que se demarca para dizer que não subscreve o que nem leu...como outros fizeram incluindo a patética ministra da Justiça que tem fama de ser muito inteligente quando eu penso que tem é muito esperto na cabeça...ahahaha.
Seria muito interessante ver algo como isto:
Ver o Sr. Presidente da República, a Sra. Ministra da Justiça, o Sr. Presidente do STJ, a Sra. Procuradora Geral da República, o Sr. Bastonário da Ordem dos Advogados, numa situação em que tivessem de decidir o caso do acórdão com base nos factos aí referidos e tivessem de dizer por que razão decidiam como decidiam.
Gostava de ver os nossos professores universitários penalistas e outros comentadores televisivos decidir este caso com base nos factos que constam do acórdão.
Adorava ver estes juízes ad hoc decidir sobre a vida de um cidadão.
Ficaria curioso. Que fundamentos usariam para obrigar o arguido a cumprir 15 meses de prisão sem o tornarem num bode expiatório?
Ou, então, para manterem a suspensão da pena.
Mas para manterem a suspensão da pena teriam de usar mais ou menos os mesmos fundamentos materiais do acórdão, claro está com outro tipo de palavreado, menos expressivo e mais asséptico.
Decidiriam como foi decidido...ou não. Porém, o STJ nunca, por nunca mandaria o arguido para prisão efectiva. E é isso que importa no caso concreto.
Hipócritas, com destaque para o pSTJ.
A santa Inquisição queimava os hereges num auto-da-fé e pronto, o herege acabava ali.
Os novos autos-da-fé trazem os hereges na brasa sem parar de os assar.
Cumpts.
Os conselheiros que assinaram o acórdão sobre o "namoro" e que para mim é bem pior que este, porém, nunca serão incomodados.
Do que postou,nesse acórdão não são feitos julgamentos de caráter.
É feito um julgamento de carácter de quem matou uma pessoa, no sentido de o não considerar "namorado" de quem matou e por causa o conceito exposto.
O que pretendo dizer é que os juizes têm necessidade de fazer julgamentos de carácter por causa da culpa. E às vezes não sabem fazê-lo e socorrem-se de ensinamentos alheios que encaixaram a mascoto, sem perceberem.
Prefiro os juízes com senso comum aos intelectuais que se socorrem de conceitos sociológicos que nem se dão ao cuidado de explicarem.
E quando lhes pedem explicações fecham-se em copas. Se um colega mete o pé na poça, ainda o criticam...
É só isso.
Parecem-me coisas bem diferentes, o recurso a conceitos e os julgamentos de caráter, ainda por cima cheios de moral serôdia e abundante adjetivação. Embora podsam cumprir a mesma finalidade.
"conceitos"? Que conceitos? O de namoro, segundo os tais conceitos sociológicos que não se indicam?
Por outro lado, o caso concreto é de um homicídio de uma mulher que foi seduzida por um psicopata que com ela andou umas semanas em passeio por aqui e por ali, prometeu-lhe uma vida melhor, e acabou por a matar.
Apanhou na primeira instância e relação, 21 anos de prisão e o STJ reduziu-lhe a a pena para 16 anos por causa de ter eliminado segundo o tal "conceito" sociológico, a relação de namoro. Como se pode ler, para o STJ tal relação não era de namoro...
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