segunda-feira, janeiro 09, 2012

O caso José Sócrates, a Uni e a PGR

José Sócrates não vai estar presente, hoje, no julgamento da UnI. Porquê, se o Ministério Público assim o requereu, depois de a sua presença ter sido prescindida por quem o indicou, ou seja a defesa de Luiz Arouca?
Na altura em que tal foi notícia, também se mencionou um facto aparentemente contraditório: embora o MºPº do julgamento requeresse a audição de José Sócrates, portanto, como testemunha de factos e não apenas abonatória, soube-se que a PGR tinha desistido de ouvir o antigo primeiro-ministro em julgamento. E tal foi noticiado pelo Diário Económico que transcreveu parte de uma informação da PGR:
O Ministério Público não pediu autonomamente para ouvir o Senhor ex-primeiro-ministro, José Sócrates. O que o Ministério Público requereu oportunamente, na sequência da apresentação da testemunha pela defesa, foi que se esta viesse a ser ouvida, o Ministério Público quereria inquiri-la também", avança fonte oficial da PGR. Concluindo: "Tendo sido retirado o requerimento pela defesa deixa de subsistir o requerimento do Ministério Público", avança fonte oficial da PGR.
Esta informação é de 14.12.2011. Porém, ainda neste fim de semana todos os media se referiram ao facto de José Sócrates estar presente hoje, em julgamento, no caso UnI.
O que se passou para que toda a gente fosse enganada assim de modo tão básico, quando havia um comunicado da PGR a dizer o que afinal se verificou hoje?
Mais: aparentemente, o MºPº do julgamento requereu mesmo autonomamente a audição de José Sócrates em julgamento. Mas tal suscita dúvidas que o comunicado da PGR não esclareceu. E essas dúvidas resultam de factos que foram notícia que ficou sem esclarecimento da mesma PGR.

Portanto vamos ao essencial da questão:
O que se pretende com o processo penal? Descobrir criminosos e só os criminosos. Julgar e punir ou absolver consoante a prova e as regras ( apertadas) que condicionam a sua produção.
Será a presença de José Sócrates assim tão importante no caso do julgamento UnI, em que se discute a prática pelos arguidos de crimes graves que lesaram o património da universidade privada? São crimes de "associação criminosa, abuso de confiança, fraude fiscal, burla, corrupção e falsificação de documentos".
Que factos estão em julgamento, por exemplo relativamente a falsificação de documentos? Não sei e porventura serão alguns relativos a licenciaturas. Como a de José Sócrates que perante todas as evidências indiciárias e resultantes das denúncias recentes do antigo vice-reitor Rui Verde e também arguido no processo, foi uma licenciatura obtida por favor. E em condições tais que a falsificação de documentos assume relevância muito importante.
Não sei se a investigação do caso UnI foi efectuada nessa vertente. Se não o foi deveria tê-lo sido e é tempo de pedir responsabilidades a quem não o fez, para saber porquê.
Porém, após os factos conhecidos recentemente através do livro de Rui Verde e que são elementos novos que acrescem aos que já se sabiam, o MºPº do DCIAP tem a estrita obrigação de reabrir o processo que foi arquivado e indagar novamente acerca dos factos relativos à falsificação que não está prescrita, mormente a que resultará de documentos existentes numa certa autarquia.
Neste contexto, a inquirição de José Sócrates no julgamento da UnI assume relevância ou não?
Evidentemente que assume, porque o seu depoimento em que será obrigado a responder com verdade acerca das perguntas que lhe forem feitas pela acusação, defesa e tribunal ( oficiosamente e em busca da verdade material, objectivo superior do processo penal) torna-se sumamente importante para comprovar, pelo menos, factos que contendem com a falsificação de documentos, crime imputado aos arguidos ou a algum deles.
O que o arguido Rui Verde relata no livro que escreveu é um requisitório sobre o crime de falsificação de documentos, em que se imputa a autoria dos factos à UnI, ou seja à própria instituição dirigida pelo principal arguido, "o seu" Luiz Arouca.

Esta factualidade é incontornável para aferição e averiguação da verdade material, objectivo superior, como se disse, do processo penal e por isso mesmo erigido em princípio que não deve ser derrogado.
Por isso mesmo só espanta que o MºPº, através da PGR tenha desistido de ouvir José Sócrates. Não se entende a justificação da PGR a propósito da falta de interesse em ouvir uma testemunha depois de a defesa que a apresentou ter prescindido da mesma e o representante legítimo do MºPº na primeira instância ( não é o PGR quem representa o MºPº na primeira instância) também ter entendido que era importante a audição dessa testemunha.
A PGR tem o dever de esclarecer duas ou três coisas depois disto:

Porque entende não ser importante ouvir José Sócrates em audiência de julgamento da UnI.
Se emitiu instrução escrita à titular do processo, na primeira instância, para desistir da audição da testemunha, prescindindo da mesma e em que condições o fez.
E se o/a representante do MºPº em julgamento concordou com essa instrução da PGR depois de ter requerido a audição da testemunha, e com a justificação apresentada pela PGR. Neste caso, quando é que decidiu prescindir da testemunha porque até à passada sexta-feira aparentemente ainda o não tinha feito...

Finalmente, o tribunal colectivo não está sujeito a hierarquias que emitam instruções ( ao contrário do que disse um Marinho e Pinto a propósito de outro assunto e em discurso de abertura de ano judicial, no ano passado). É nisso que radica a independência dos tribunais e os respectivos juízes podem ( e a meu ver devem) arrolar oficiosamente a mesma testemunha, perante estes factos estranhos, em consideração pelo princípio da verdade material vertido neste caso no artº 340º do CPP: "O tribunal ordena, oficiosamente ou a requerimento, a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa."
O tribunal pode e deve ( a meu ver) não só arrolar tal testemunha como juntar aos autos o livro de Rui Verde. É essencial tal prova para a descoberta da verdade. Até porque os arguidos podem mentir...

Aditamento: Se no requerimento do MºPº para ouvir José Sócrates em audiência de julgamento, na sequência de requerimento da defesa para tal, se diz que a sua audição é importante para a descoberta da verdade e se refere que é a mesma requerida por ter sido aludido o seu nome por diversas testemunhas, então o requerimento do MºPº é para todos os efeitos, um requerimento autónomo, suficiente por si só para se entender a audição de José Sócrates separado da defesa e independente dela e não se compreende por isso o teor do comunicado da PGR.
Há que esclarecer tal facto.
Mais: nesse caso não se compreende também a atitude do advogado de José Sócrates, Proença de Carvalho, porque não deveria ter dito ao seu cliente para faltar. É que nesse caso, o mesmo já iria ser ouvido por outra parte processual que não apenas a defesa.
Com advogados destes, estamos bem servidos.
Entretanto, o jornalismo tipo para quem é, bacalhau basta, informado pelos mesmos do costume, já fala em "erro da juíza"...

Questuber! Mais um escândalo!