sábado, novembro 29, 2014

Presunções deletérias sobre o recluso 44



Ainda sobre a crónica de João Miguel Tavares em que declarou urbi et orbi que tem o direito de presumir a culpa do recluso 44 à margem de outra qualquer presunção, maxime judicial. E explicou porque razão lhe assiste tal direito: " face ao que leio nos jornais, às minhas deduções, às minhas convicções, à minha experiência, à minha memória e ao esgotamento das sete presunções de inocência".
Tanto bastou para que ontem outro cronista lhe chamasse pedaço de asno e hoje dois outros refutem a teoria  singela que é filha apenas do senso comum.
É um sinal jacobino refutar o senso comum em prol de ideias feitas  de um legalismo à outrance,  conveniente para suportar ideias políticas e ideologicamente marcadas pela oposição à vox populi e estribadas quase sempre numa esquerda que brande um suposto humanismo associado à ideia democrática republicana socialista e laica.
Esse sinal  detecta-se pefeitamente no pedigree de quem escreve e assim manifesta idiossincrasias de pertença ao clube dos poetas utópicos da revolução permanente ou da inquietação constante com igualdades inatingíveis.
O primeiro é o  jornalista Óscar Mascarenhas no Diário de Notícias de hoje.  Admite a inversão da presunção mas acompanhado do ónus da prova...condição sine qua non para se poder escreve o que JMT escreveu. É argumento do género " prendam-no ou calem-se", usado pelo FF que não consegue distinguir asnos  sem ser com provas dadas. 
Portanto, com provas já é possível inverter a presunção,  mas essa prova é demais por uma razão: com provas não se presume a culpa, afirma-se. E não é esse o papel de quem presume baseado em factos tangíveis e intangíveis, o chamado "não factual que se capta por fenómenos indirectos",  como já disse o outro cronista, João Pedro Marques, no Público de hoje e que afina pelo mesmo diapasão da dúvida quando ao inocente presumido por causa do perigo de "linchamento" . 


Neste casos, quem presume atira o ónus para o outro. Se presumir inocência, espera que alguém prove a culpa? Pois esse é outro problema.  É que pode esperar nada disso, como se depreende de quem se preocupa agora com estas presunções. 
 Ora lei-se o que se escreve na Tabu do Sol, sobre tal fenómeno interessante...


Geralmente quem  exige publicamente um recato e silêncio em nome de uma presunção de inocência jacobina e hipócrita não está nada à espera que o prato da balança se equilibre para a justiça perfeita que é a de dar a cada um aquilo que lhe pertence, incluindo a inocência real. Pretende apenas que as coisas fiquem como estão. Res sic stantibus e não se fala mais nisso que não é conveniente. Daí a hipocrisia de quem assim escreve.  Quando muito esperam apenas pela justiça formal das provas formais que muitas vezes denegam a justiça material por causa de mecanismos idiossincráticos já explicados ( evitar que se condenem inocentes...) e é por essa salvífica e redentora prova de inocência que esperam e nada mais. A justiça nisto nem é vista nem achada.
Por outro lado, a prova redentora  dessa liberdade de presumir culpado quem  a lei presume inocente reside na exigência de  apresentação de factos. 
E que factos existem relativamente a este presunto inocente que alguns presumem ao contrário baseados no tal senso comum anti-jacobino?
Factos é o que não falta neste caso. Alguns equívocos, outros evidentes de substância e peso e outros ainda ocultos de significado. 
O que é que o jornalista ou investigador amador poderá fazer para apresentar a sua versão consolidada da culpa transformada em sentença condenatória, após a presumir como tal?
Por mim deve fazer o que a personagem de Umberto Eco,  o frade franciscano Guilherme de Baskerville, no livro O Nome da Rosa fez:  duvidar das aparências mas indagar os indícios e concluir certezas com base em métodos de raciocínio, apresentando depois as provas que o engenho prático  descobriu. Provas convincentes mas com margem de refutabilidade suficiente para outros investigadores concluirem de modo diverso e por fim evidenciar o irrefutável. 
Se alguém leu o livro percebe que há duas investigações do caso estranho dos homicídios num convento beneditino medieval e duas conclusões diferentes e assentando em lógicas  também diversas.   A oficial baseia-se na presunção de culpa de quem aparente tal qualidade e assim se basta se os indícios forem ajustados às suspeitas. A segunda  na dúvida metódica e permanente até se deslindar logicamente a verdade factual com base em factos concretos e de importância irrefutável.
Para chegar ao resultado, o investigador de Eco deduz, induz e abduz. Ou seja, parte de presunções de inocência, culpa e mistura ambas as qualidades para testar as hipóteses plausíveis. 
No caso do recluso 44 um jornalista ou investigador amador pouco pode fazer para apresentar as provas irrefutáveis, o que denota a hipocrisia do jornalista Mascarenhas,  mas pode fazer muito para ajudar a reflectir e resolver o enigma que se apresenta:  o recluso 44 é culpado ou inocente do que é acusado?
É isso que se pretende do jornalismo e é nisso que deve assentar a presunção de culpa referida por JMT: apresentar factos e por vezes interpretá-los para o leitor perceber do que se trata.  Pode com isso manifestar uma opinião? Pode mas corre o risco de perder credibilidade analítica se se revelar errada. Pode insinuar uma posição pessoal naquilo que escreve? Mas isso é o que todos fazem  e não deviam. E a diferença é que neste caso, tal como noutros,  o fazem segundo crenças e não segundo razões.  É esse o drama de todo o jornalismo nacional e que estes dois cronistas também denotam e aquele escrito na Tabu nota.
A presunção de inocência absoluta num contexto destes em que já se conhecem vários factos,  tomada a priori pelo jornalista,  revela apenas uma idiossincrasia jacobina e irrealista, uma vez que nem os próprios acreditam nela por ter que supor uma dúvida e um eventual erro de análise. 
A presunção de inocência absoluta não existe porque   não se deve meter as mãos no fogo por ninguém em casos como este, o que é do elementar senso comum.
Quer isto dizer então que se deve presumir a culpabilidade jurídica e comprovada pelas provas admissíveis em direito penal?  Nem tanto. O que se deve presumir é que perante factos tem que haver argumentos de quem é o imputado autor dos mesmos factos. Explicações, quero dizer.  E isso já é passar para o lado da inversão do ónus da prova, fora das regras processuais penais, mas válidas na praça pública.
No caso concreto perante o conhecimento de existência de contas bancárias com montantes elevados, pertença de um amigo de infância, suspeito de ter sido beneficiado em concursos de obras e que   ganhou por ser amigo, reflectindo essas contas movimentos muito importantes de dinheiro  em favor do suspeito que as outrogou, as provas a apresentar em julgamento são as exigidas por lei.  Os factos relativos ao motorista, às malas com dinheiro e entregas em mão, as utilizações de diversos subterfúgios típicos de quem quer ocultar a proveniência de dinheiro sujo, o circuito dos milhões para a Suíça e de ida e volta, tendo como beneficiário dessas contas o suspeito recluso, inculcam uma ideia que não pode ser simplesmente desvalorizada em função de qualquer presunção de inocência. Só por mera estultícia se poderia argumentar que tais indícios e provas, sendo insuficientes para provocar uma condenação judicial também o são para se poder julgar o comportamento cívico do suspeito. E é nesta vertente cívica que os jornalistas e cronistas tem um campo amplo de manobra relativamente a quem exerce cargos públicos.
Por outro lado se estivesse em vigor a lei de enriquecimento ilícito, o ónus de prova seria exactamente esse: incumbiria ao suspeito provar que tais factos não demonstram o que parecem demonstrar...e tal lei que é vigente em alguns países democráticos só não foi aprovada em Portugal por oposição do agora recluso 44 . Outra presunção...
As provas perante a opinião pública são de outra ordem: devem convencer  os cidadãos que esses  são factos anódinos e sem relevância criminal e quem tem a obrigação estrita de o fazer é quem está debaixo do fogo da opinião pública, legitimamente por ter exercido cargos públicos da mais alta relevância e poder, sob pena de as suspeitas se manterem e a presunção de inocência se abandonar efectivamente .  Por uma razão: as suspeitas já são  da ordem das regras mais elementares da experiência comum e  não provenientes de qualquer cabala inexplicável ou suspeita.  As suspeitas são plausíveis e carecem de comprovação da inocência, não da culpabilidade,  no seio da opinião pública.
Quem presume a culpabilidade neste contexto não afirma a ausência de inocência. Apenas espera que essa presunção legitimada pelo senso comum seja elidida por quem tem esse dever pessoal que não obedece a regras processuais mas de puro senso comum.
Neste jornalismo não se está a condenar ninguém num tribunal judicial com regras que são outras. Está a julgar-se, legitimamente, quem é acusado pelos factos e não apenas pelas opiniões. E são os factos que apresentam estas provas. Ao acusado compete defender-se se quiser fazer valer a sua real inocência.
Quem argumenta com o contrário está a inverter a ordem de razões e a misturar a ordem de prova judicial com a ordem de prova pública e de senso comum.Seria irrealista defender o direito e o dever do silêncio enquanto decorre a prova judicial.
E por outra razão ainda: as regras de prova nos processos penais são de tal ordem que pode suceder que essa culpabilidade não se prove e as suspeitas continuarem a ser pesadas e congruentes.
Já sabemos que o mesmo nega qualquer culpa, mas isso é o mais trivial das histórias policiais. Perante os tribunais bastar-lhe-á tal atitude porque as regras processuais incumbem a quem acusa e o dever de provar torna-se assim imanente, para não se tornar ao tempo medieval da inversão do ónus de prova e se poderem  condenar inocentes com base no pressuposto de que Deus escolherá os seus. 
Porém, como este lençol já vai longo fica para outro postal.
De resto, a prova dessa atitude jacobina podemos encontrá-la no passado recente e em casos concretos que ocorreram no espaço mediático nacional.
Porém, perante o tribunal da opinião pública tal atitude não bastará para afastar a presunção porque é assim que as regras da vida funcionam por muito que os jacobinos de serviço o neguem sem convencer ninguém porque apenas apresentam essas regras formais como mais uma arma de afirmação ideológica.


De resto, a prova dessa atitude jacobina podemos encontrá-la no passado recente e em casos concretos que ocorreram no espaço mediático nacional.
Porém, como este lençol já vai longo fica para outro postal.

Questuber! Mais um escândalo!