Daqui, este excerto sobre o Ministério Público que temos:
“O Ministério Público encontra-se num beco sem saída.” A opinião deste Procurador-geral adjunto (actualmente, inspector do MP) está expressa no seu blogue pessoal http: / /outrosdireitos.blogspot.com. Para Alípio Ribeiro, ninguém empurrou esta magistratura para o tal beco, mas ela “caminhou para lá, alegremente, entre ditos e mexericos”.
Para Alípio Ribeiro, a solução para crise no MP está na própria hierarquia: “Enquanto não for assumida e não for compreendido que a tão proclamada autonomia é o resultado daquela, [o MP] continuará a ser um rosto sem voz e uma estrutura sem propósito”.
Confesso não entender este entendimento do MP. Ainda para mais, exarado por um distinto magistrado que não assina como tal ( nem poderia ou deveria, no meu modesto entender) e por isso argumentarei com Alípio Ribeiro num plano de relativa igualdade blogueira, até porque o mesmo pode facilmente saber quem sou ( não me escondo num nick manhoso nem asseguro que estou em colectivo...).
Assim, o que significa um MP como "um rosto sem voz e uma estrutura sem propósito"?
Todos sabem ou podem saber o que o MP português é. Para poupar tempo e esforço a quem quiser actualização de conhecimentos, cito um dos escultores desse rosto e estrutura:
Figueiredo Dias, que teoricamente detém uma autoridade inquestionável, dizia há uns anos atrás: " não existe outro modelo de ministério público que sobreleve em vantagens ou sequer iguale, o adoptado pelo processo penal português".
Em 1999, numa entrevista ao O Diabo, dizia: “Do meu ponto de vista, o modelo de repartição de competências entre os magistrados judiciais e o ministério público é o melhor que se pode ter , é o que eu defendo. Como é o modelo do relacionamento entre o MP e as polícias.”
Perante este modelo de MP, o que será a falta de voz? A ausência de explicações adequadas de despachos de arquivamento ou acusação, proferidos pelos seus magistrados e estruturas dirigentes particulares, como o DIAP e o DCIAP?
E quem é o rosto actual do MP? Um rosto tipo Jano, com dupla face, num lado o PGR e do outro todo o MP de base? Ou a multifaceta própria de um organismo colectivo com diversas figuras de proa que dantes, no ancien régime, se assumiam como duques, marquesas e condes?
Mais ainda: o que é uma "estrutura sem propósito"? Não entendo de todo porque o propósito está de tal modo definido que a estrutura não lhe pode fugir. O MP exerce a acção penal, em exclusivo e representa por vezes o Estado ( quando este lhe pede ou por feição própria) e ainda outros propósitos como a defesa de interesses de incapazes e interesses difusos, cada vez mais alargados porque até as empresas públicas lhe podem pedir representação.
Perante esta realidade que Alípio Ribeiro não ignora, resta o outro problema elencado no pequeno postal sucinto: a hierarquia e o seu exercício que condiciona a autonomia.
Como deveria ser o exercício hierárquico para evitar o efeito deletério em relação à autonomia?
Sabemos que o MP é um órgão cujo PGR exerce o poder que a lei lhe confere, em autocracia. O PGR não responde perante nenhum outro órgão do MP e depende do Governo que o escolhe e indica ao presidente da República.
Para além disso, a lei, no estatuto do MP, confere a cada um dos escalões de magistrados que exercem na primeira, segunda e última instância, poderes próprios de uma autonomia que os define como são: magistrados, sujeitos à lei e cujas ordens de superiores só actuam no âmbito de processos e segundo regras prè-definidas legalmente.
Um superior hierárquico se entender que o trabalho concreto de um subordinado hierarquicamente não é o que deveria ser, tem uma de duas opções: ou avoca o processo concreto, explicando por que o faz e assume a responsabilidade de o despachar; ou participa factos susceptíveis de apreciação disciplinar, ao respectivo conselho superior.
Além disso, o magistrado de base, está sujeito a inspecções periódicas pelos inspectores de carreira no MP. Será que isto precisa de mudança, para tornar o MP mais semelhante a uma estrutura militar com rosto de sargentos, coronéis e ordenanças, em vez de duques e condes?
Como pretende então Alípio Ribeiro que seja esse poder hierárquico? Não é a primeira vez que assim manifesta publicamente a sua ideia de mudança, mas não indica o roteiro. Nem sinal dele ou do seu esquisso sumário.
Por exemplo, o papel do actual PGR, ao avocar em modo desusado, um processo que em princípio teria competência material para despachar ( o único processo em que tal sucede, ao abranger responsabilidade de titulares de órgãos de soberania como o PM), agiu no âmbito dessa tão almejada hierarquia com rosto?
Pretende Alípio Ribeiro sindicar o modelo actual, elogiado por Figueiredo Dias, no sentido de o delapidar da autonomia existente, nos escalões intermédios, e permitir a ordem directa e sem rodeios dos superiores hierárquicos para os escalões inferiores?
Não sei. Confesso que não sei e não imagino qual seja exactamente o modelo ideal sugerido por Alípio Ribeiro.
“O Ministério Público encontra-se num beco sem saída.” A opinião deste Procurador-geral adjunto (actualmente, inspector do MP) está expressa no seu blogue pessoal http: / /outrosdireitos.blogspot.com. Para Alípio Ribeiro, ninguém empurrou esta magistratura para o tal beco, mas ela “caminhou para lá, alegremente, entre ditos e mexericos”.
Para Alípio Ribeiro, a solução para crise no MP está na própria hierarquia: “Enquanto não for assumida e não for compreendido que a tão proclamada autonomia é o resultado daquela, [o MP] continuará a ser um rosto sem voz e uma estrutura sem propósito”.
Confesso não entender este entendimento do MP. Ainda para mais, exarado por um distinto magistrado que não assina como tal ( nem poderia ou deveria, no meu modesto entender) e por isso argumentarei com Alípio Ribeiro num plano de relativa igualdade blogueira, até porque o mesmo pode facilmente saber quem sou ( não me escondo num nick manhoso nem asseguro que estou em colectivo...).
Assim, o que significa um MP como "um rosto sem voz e uma estrutura sem propósito"?
Todos sabem ou podem saber o que o MP português é. Para poupar tempo e esforço a quem quiser actualização de conhecimentos, cito um dos escultores desse rosto e estrutura:
Figueiredo Dias, que teoricamente detém uma autoridade inquestionável, dizia há uns anos atrás: " não existe outro modelo de ministério público que sobreleve em vantagens ou sequer iguale, o adoptado pelo processo penal português".
Em 1999, numa entrevista ao O Diabo, dizia: “Do meu ponto de vista, o modelo de repartição de competências entre os magistrados judiciais e o ministério público é o melhor que se pode ter , é o que eu defendo. Como é o modelo do relacionamento entre o MP e as polícias.”
Perante este modelo de MP, o que será a falta de voz? A ausência de explicações adequadas de despachos de arquivamento ou acusação, proferidos pelos seus magistrados e estruturas dirigentes particulares, como o DIAP e o DCIAP?
E quem é o rosto actual do MP? Um rosto tipo Jano, com dupla face, num lado o PGR e do outro todo o MP de base? Ou a multifaceta própria de um organismo colectivo com diversas figuras de proa que dantes, no ancien régime, se assumiam como duques, marquesas e condes?
Mais ainda: o que é uma "estrutura sem propósito"? Não entendo de todo porque o propósito está de tal modo definido que a estrutura não lhe pode fugir. O MP exerce a acção penal, em exclusivo e representa por vezes o Estado ( quando este lhe pede ou por feição própria) e ainda outros propósitos como a defesa de interesses de incapazes e interesses difusos, cada vez mais alargados porque até as empresas públicas lhe podem pedir representação.
Perante esta realidade que Alípio Ribeiro não ignora, resta o outro problema elencado no pequeno postal sucinto: a hierarquia e o seu exercício que condiciona a autonomia.
Como deveria ser o exercício hierárquico para evitar o efeito deletério em relação à autonomia?
Sabemos que o MP é um órgão cujo PGR exerce o poder que a lei lhe confere, em autocracia. O PGR não responde perante nenhum outro órgão do MP e depende do Governo que o escolhe e indica ao presidente da República.
Para além disso, a lei, no estatuto do MP, confere a cada um dos escalões de magistrados que exercem na primeira, segunda e última instância, poderes próprios de uma autonomia que os define como são: magistrados, sujeitos à lei e cujas ordens de superiores só actuam no âmbito de processos e segundo regras prè-definidas legalmente.
Um superior hierárquico se entender que o trabalho concreto de um subordinado hierarquicamente não é o que deveria ser, tem uma de duas opções: ou avoca o processo concreto, explicando por que o faz e assume a responsabilidade de o despachar; ou participa factos susceptíveis de apreciação disciplinar, ao respectivo conselho superior.
Além disso, o magistrado de base, está sujeito a inspecções periódicas pelos inspectores de carreira no MP. Será que isto precisa de mudança, para tornar o MP mais semelhante a uma estrutura militar com rosto de sargentos, coronéis e ordenanças, em vez de duques e condes?
Como pretende então Alípio Ribeiro que seja esse poder hierárquico? Não é a primeira vez que assim manifesta publicamente a sua ideia de mudança, mas não indica o roteiro. Nem sinal dele ou do seu esquisso sumário.
Por exemplo, o papel do actual PGR, ao avocar em modo desusado, um processo que em princípio teria competência material para despachar ( o único processo em que tal sucede, ao abranger responsabilidade de titulares de órgãos de soberania como o PM), agiu no âmbito dessa tão almejada hierarquia com rosto?
Pretende Alípio Ribeiro sindicar o modelo actual, elogiado por Figueiredo Dias, no sentido de o delapidar da autonomia existente, nos escalões intermédios, e permitir a ordem directa e sem rodeios dos superiores hierárquicos para os escalões inferiores?
Não sei. Confesso que não sei e não imagino qual seja exactamente o modelo ideal sugerido por Alípio Ribeiro.
2 comentários:
Não há nenhum problema com a estrutura do MP tal como está. É respeitadora da separação de poderes, porque não é politicamente tutelada e defende os cidadãos, porque garante a objectividade e a legalidade da acção da instituição, assim como separa quem acusa de quem condena.
A haver alterações a fazer elas prendem-se com a cúpula da organização: o PGR deve passar a ser nomeado por uma ampla maioria na AR (2/3 ou 3/4 dos votos) e ratificada a nomeação pelo PR; o Conselho Superior do MP deve ser composto exclusivamente por magistrados do ministério público, eleitos pelos pares, sem qualquer interferência do poder político (mesmo vale naturalmente para a magistratura judicial, ou seja, para o CSM).
Do que decorre que a crítica que se pode fazer é, quando muito, que a autonomia do MP não é levada até aos limites como deveria ser. E sabe-se bem que nem mesmo a estrutura mais perfeita protege os cidadãos das cumplicidades que existem inevitavelmente num país pequeno como o nosso.
Não quero estragar o debate sobre o tema, mas não tenho a certeza que o própio Alípio Ribeiro saiba muito bem o que pretende significar com o que escreveu. AR é um esteta, que gosta de ser notado não tanto pelo que diz, mas pela forma como o faz. E sem que tal seja, necessariamente, revelador de uma opinião estruturada ou fundamentada sobre o tema. É importante, isso sim, que a frase ou texto (sempre, mas sempre, passíveis de múltiplas interpretações) transmitam a ideia de que o seu autor sabe ou quer dizer muito mais do que aquilo que realmente disse ou escreveu... e que, não raro, é coisa pouca ou nenhuma. Os ditos de AR, mais do que um honesto exercício intelectual, pretendem ser uma obra estéticamente bem conseguida, reflexo de uma imensa vaidade pessoal. É isso que lhe tem permitido, com a mesma expressão sibilina e de forma quase incólume, dizer uma coisa num dia e exactamente o seu contrário no dia seguinte. Mas relativamente a este particular texto de AR até arrisco um significado:- "para o caso de correrem com o Dr. Pinto Monteiro, apresento desde já a minha candidatura ao lugar"
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