sexta-feira, setembro 30, 2011

O circo mediático

Isaltino Morais foi preso ontem, por ordem de um juiz do tribunal de Oeiras que entendeu que a decisão que aplicou dois anos de prisão preventiva ao autarca, tinha transitado em julgado e portanto devia ser cumprido o tempo de prisão.

Hoje, o tribunal de Oeiras, decidiu em sentido contrário, libertando o arguido, justificando a decisão com base no princípio in dubio pro reo.

Como é que isto tem sido noticiado durante a tarde?
Assim:
A defesa de Isaltino Morais tinha recebido uma notificação do Tribunal de Oeiras onde referia que "se o arguido juntasse o original da certidão do TC a declarar que o recurso pendente no TC tem efeitos suspensivos" seria emitido um mandado de libertação do arguido.

A decisão foi tomada pela juíza Carla Cardador depois de uma reunião com o procurador do Ministério Público Fernando Gamboa.

No despacho da juíza do tribunal de Oeiras, a decisão foi fundamentada no princípio “in dubio pro reo” (em caso de dúvida, decide-se a favor do réu). O tribunal de primeira estância não tinha conhecimento de um outro recurso no Tribunal Constitucional e a dúvida se este recurso teria ou não efeito suspensivo da execução da pena levou a decidir pela sua libertação. (Lusa)

Assim:
A efectiva libertação do autarca foi confirmada pelo seu advogado Carlos Pinto de Abreu que informou a RTP de que o seu cliente já não se encontrava no estabelecimento prisional. Os ponteiros dos relógios ainda não marcavam as 18h30 quando Isaltino Morais abandonou o estabelecimento prisional, conseguindo evitar os inúmeros jornalistas que se encontravam no local à espera da capturar a sua saída.
Conhecida à hora de almoço o despacho do Tribunal Constitucional dando conta ao Tribunal de Oeiras da existência do recurso interposto pela defesa naquele Tribunal, a libertação foi logo exigida pelos advogados de Isaltino Morais com o fundamento na ilegalidade da detenção.
Fonte do tribunal citada pela TSF informou entretanto que a decisão da libertação de Isaltino Morais foi fundamentada no princípio "in dubio pro reo" (em caso de existência de dúvida, a decisão a proferir deve ser a favor do réu). (RTP)

Assim:
A certidão pedida na quinta-feira ao Tribunal Constitucional pela defesa de Isaltino Morais a comprovar o efeito suspensivo do recurso pendente já deu entrada no Tribunal de Oeiras.

Rui Elói Ferreira adiantou que a defesa de Isaltino recebeu uma notificação do Tribunal de Oeiras onde referia que "se o arguido juntasse o original da certidão do TC a declarar que o recurso pendente no TC tem efeitos suspensivos" será emitido um mandado de libertação do arguido.

Segundo a SIC-Notícias, a magistrada responsável por este processo proferiu um despacho a pedir esclarecimentos aos tribunais superiores, o que poderá atrasar a libertação do presidente da Câmara. No entanto, o "Público" garante que o autarca "vai ser libertado ainda esta tarde". ( Expresso)

E agora reparem nesta notícia com algumas horas:

«O Tribunal não se pronunciou nem tem que se pronunciar sobre o efeito suspensivo do recurso apresentado», afirma fonte oficial do TC.

O recurso em causa está relacionado com o facto de Isaltino não ter sido julgado por um tribunal de júri em Oeiras.

A mesma fonte assegura que um segundo recurso de Isaltino (relacionado com a ausência de uma perícia de personalidade do edil de Oeiras) já foi decidido, não tendo sido dado provimento aos argumentos do autarca. Esta decisão transitou em julgado no passado dia 19 de Setembro.

Esta afirmação contraria em absoluto as acusações dos advogados Carlos Pinto Abreu e Rui Elói Ferreira do autarca de Oeiras. «Há um recurso pendente ao qual foi dado efeitos suspensivos no TC, logo a decisão não transitou em julgado. Isto é claro, factual e objectivo», afirmou Pinto Abreu após ter visitado Isaltino Morais no estabelecimento prisional da Polícia Judiciária (PJ). Este é o principal argumento da defesa para alegar a ilegalidade da detenção. (Sol)

Perceberam, não perceberam? A única questão que era preciso saber para informar correctamente era esta: a decisão do tribunal de Oeiras, condenatória, transitou em julgado ou não? E os recursos para o Tribunal Constitucional impedem esse efeito ou não? Ou seja, têm ou não efeito suspensivo?

Alguém sabe responder a esta questão muito simples? Alguém procurou saber os pormenores sobre isso? Alguém perguntou a um magistrado especializado ou a alguém versado no assunto como é que são estas coisas?

O jornalismo português é assim: meia bola e força. Para quem é bacalhau basta.

Poderiam ter ido ao Google e escrever recurso penal para o tribunal constitucional efeito suspensivo. Davam logo de caras com este acórdão:

I - A providência de habeas corpus assume uma natureza excepcional, a ser utilizada quando falham as demais garantias defensivas do direito de liberdade, para pôr termo a situações de detenção ou de prisão ilegais. Por isso, a medida não pode ser utilizada para impugnar irregularidades processuais ou para conhecer da bondade de decisões judiciais, que têm o recurso como sede própria para a sua reapreciação.

II- Numa situação em que:

- a exequibilidade da sentença condenatória proferida no Proc. n.º 1…, do … Juízo de A…assenta em decisão deste STJ, proferida nos termos permitidos pelos arts. 720.º do CPC e 4.º do CPP, que mandou baixar o processo para execução do julgado devido a comportamento processual abusivo e dilatório do requerente;

- o requerente interpôs recurso para o TC desta decisão, proferida em 04-10-2007, recurso que não foi admitido com efeito suspensivo, nem poderia ter sido, como resulta da conjugação do disposto no art. 408.º do CPP com o art. 78.º, n.º 1, da Lei 28/82, de 15-11 (Lei de Organização e Funcionamento do Tribunal Constitucional), pois que, conforme dispõe aquele art. 78.º, n.º 1, o recurso de constitucionalidade de decisão que não admita outro por razões de valor ou de alçada tem os efeitos e o regime de subida do recurso que no caso caberia se os referidos critérios e pressupostos o permitissem [a autonomia da decisão em causa, que se não pronuncia sobre qualquer matéria de recurso por ocasião do qual é proferida, nem decide de qualquer questão que seja objecto do recurso, isola-a da fase do recurso, remetendo a definição dos efeitos do recurso de constitucionalidade para o regime do art. 78.º, n.º 1, da referida Lei 28/82];

- dessa decisão, proferida pelo STJ, não é admissível qualquer outro recurso, mas, mesmo que o fosse, não caberia em nenhuma das previsões do art. 408.º do CPP, que especifica os casos em que o recurso tem efeito suspensivo;

- não tendo sido admitido recurso com efeito suspensivo, nem podendo ter este efeito, o recurso tem (teve) efeito devolutivo, não afectando o sentido e as consequências executivas da decisão que, aplicando o art. 720.º, n.º 1, do CPP, mandou baixar o processo para execução do julgado;

Claro que Isaltino, neste momento a falar em directo ( 20:35) aproveita este equívoco para fazer a costumada demagocia...fala como se fosse inocente e a prisão fosse um erro grosseiro de grande calibre. Deus queira que não tenha que engolir tudo o que disse. O jornalista da RTP que comenta a declaração devia estar calado.

Entretanto, o advogado Rogério Alves também comenta sem saber bem o que se passou. Mas diz uma coisa importante: que havia dois recursos no Tribunal Constitucional e um deles foi resolvido. O outro continua pendente.

Há uma série de perguntas a colocar agora e que os jornalistas deviam colocar: quem é o relator deste recurso, no Tribunal Constitucional? Qual a sua produtividade? Porque demora tanto tempo a prolatar uma decisão tão importante e que coloca em causa toda a imagem da justiça em Portugal? Porque é que não se pedem contas a estes juízes do Tribunal Constitucional que não são inspeccionados, não respondem perante ninguém e ninguém se importa porque demoram tanto tempo nestas decisões? Estes juízes têm regalias pessoais que os demais juizes nem sonham. Têm carro do Estado, trabalham em casa, não tem muitos processos a seu cargo, tem assessores, etc etc.

Então porque demoram tempo infindo nestas decisões? O caso da pequena Esmeralda demorou dois anos no Tribunal Constitucional e o juiz que o decidiu ainda lá está...