No DN de hoje, o historiador Jerónimo de Sousa, um antigo afinador de máquinas que tirou o curso de alfabetização em História, à noite, enquanto acumulava horários de trabalho no Parlamento e na fábrica ( facto real) escreve uma série de obscenidades.
Em 31 de Outubro de 1979 como mostra esta foto no O Jornal, Jerónimo já estava reformado do trabalho como operário e charlava com os seus pares, professores universitários de Direito, em Coimbra..era o tempo em que os deputados do PCP davam ao partido o que recebiam "a mais".
Jerónimo, aliás, ainda vive nesse tempo, prè-queda do Muro. Ainda continuará da dar ao Partido o que recebe "a mais"?
A imagem deve ser da revista Sputnik, as Seleções do Reader´s Digest soviéticas.
José Milhazes, no Observador, responde a este texto eivado de falsidades que evidentemente não é inteiramente da autoria de Jerónimo, mas do "colectivo", como é de rigor...
O enfraquecimento e degeneração intelectuais do Partido Comunista
Português são um facto cada vez mais evidente, principalmente quando o
seu dirigente Jerónimo de Sousa mente, falsifica a História e tenta
passar mais uma certidão de idiota aos portugueses.
Num artigo de opinião
publicado no DN, o secretário-geral comunista começa por escrever: “Foi
numa Rússia semifeudal, dominada pelo poder autocrático e repressivo
dos czares e da mais alta nobreza, com mais de cem nacionalidades
oprimidas, destruída pela I Guerra Mundial, com um povo fustigado pela
exploração, a repressão, a pobreza, a fome e o analfabetismo que, no dia
7 de Novembro de 1917 (25 de Outubro no antigo calendário russo), o
proletariado russo, com o papel de vanguarda do Partido Bolchevique,
conquistou o poder e lançou as bases de uma nova sociedade sem a
exploração do homem pelo homem”.
Ora qualquer aluno do 12º ano sabe que aqui há uma série de mentiras
ou de indícios de analfabetismo histórico. Primeiro, a revolução
comunista não foi feita contra o “poder autocrático e repressivo dos
czares e da mais alta nobreza”, mas contra um Governo Provisório que
mantinha na Rússia um sistema pluripartidário e se preparava para dar
uma Constituição democrática ao país”. Segundo, não foi o proletariado
russo que tomou o poder, mas um pequeno grupo de bolcheviques que só na
cabeça de Jerónimo de Sousa queriam criar um regime sem exploração do
homem pelo homem. O dirigente comunista não deve conhecer a velha
anedota soviética: “Qual a diferença entre o capitalismo e o socialismo?
O capitalismo é a exploração do homem pelo homem, enquanto que o
socialismo é exactamente o contrário”.
Claro que ninguém duvida, como escreve o dirigente comunista, que “a
Revolução de Outubro é (e continuará a ser) o acontecimento maior da
história da humanidade”, mas diz apenas meia-verdade pois mente ao
afirmar “que inaugurou uma nova época, a época da passagem do
capitalismo ao socialismo”. Pergunta-se: onde está esse socialismo
actualmente na Rússia e na maioria dos países que enveredaram ou,
melhor, foram obrigados a enveredar por essa via de desenvolvimento? Deu
lugar novamente ao capitalismo. Até na China se transforma cada vez
mais num regime capitalista oligárquico que explora os trabalhadores até
ao tutano.
Jerónimo de Sousa mente também quando afirma que a revolução
resultante do golpe de Estado comunista “fica marcada como a primeira e
única a empreender com êxito a gigantesca tarefa de construir uma
sociedade nova em que os recursos, os meios e os instrumentos do Estado e
do país foram postos ao serviço do povo”. Como é sabido, a União
Soviética era dirigida por uma oligarquia que, às vezes, nem sequer
atirava migalhas ao povo. Será que os milhões de soviéticos que morreram
de fome tinham os recursos, os meios e os instrumentos de que fala o
líder comunista, mas não sabiam?
É hilariante a afirmação de que “a edificação do novo Estado
significou a instauração de um verdadeiro e genuíno poder popular, uma
nova forma de democracia participativa – os sovietes”.
Qualquer pessoa minimamente informada sabe que os sovietes não eram
mais do que correias de transmissão do único partido existente na URSS: o
PCUS. Os sovietes foram completamente burocratizados e não passaram de
mais um instrumento de limitação das mais elementares normas
democráticas. Senhor Jerónimo de Sousa, a democracia não tem adjectivos:
ou é ou não é.
Bem, eu pagaria para ver o dirigente comunista dizer aos chechenos,
tártaros da Crimeia, estónios, lituanos, etc., etc., o seguinte: “De
facto, a fundação em Dezembro de 1922 da URSS como união voluntária de
nações iguais em direitos, significou um exemplo para todo o mundo da
forma como a nova sociedade se construía e dos novos princípios em que
se baseava e resolveu um gigantesco e complexo problema nacional”. As
deportações em massa, a que dezenas de povos foram sujeitos, é mais uma
prova de que Jerónimo de Sousa foge à verdade.
Parafraseando António Aleixo, para que as mentiras passem melhor é
preciso misturar alguma verdade: “A URSS, num curto período de tempo
histórico, alcançou um significativo desenvolvimento industrial e
agrícola, erradicou o analfabetismo e generalizou a escolarização e o
desporto, eliminou o desemprego, assegurou a saúde pública e a protecção
social, garantiu e promoveu os direitos das mulheres, das crianças, dos
jovens e dos idosos, expandiu o impacto dos movimentos de vanguarda
artística e as formas de criação e de fruição da cultura, conquistou um
elevado nível científico e técnico, colocou em prática formas de
participação democrática dos trabalhadores e das massas populares,
empreendeu a solução da complexa questão de nacionalidades oprimidas,
incrementou os valores da amizade, da solidariedade, da paz e cooperação
entre os povos”.
Quanto á vanguarda artística e formas de criação, por exemplo, o
dirigente comunista faz de conta desconhecer em que se transformou a
arte soviética, numa coisa chamada “realismo socialista”, que matou
qualquer tipo de criatividade. Os inovadores, fossem escritores,
pintores ou músicos, foram perseguidos, presos ou obrigados a fugir da
URSS.
Aqui recordo mais uma anedota soviética. “O que é um trio soviético? É
o que resta de uma orquestra do Teatro Bolshoi depois de uma digressão
pelo Ocidente”.
No que respeita à amizade dos povos, Jerónimo de Sousa certamente não
terá em vista o anti-semitismo ou as perseguições de que acima falei.
Estaria de acordo quando o líder comunista escreve sobre os êxitos
económicos e sociais que “no final da década de 80 do século XX, a URSS
encontrava-se na vanguarda em diversas tecnologias; possuía um terço do
total de médicos do mundo e a mais baixa taxa de mortalidade do planeta”
ou ainda que “em 1980, a União Soviética tinha 997 médicos para 10 mil
habitantes e todos os tipos de assistência médica eram gratuitos”, mas
só se ele fosse capaz de explicar o que levou uma superpotência tão
próspera a ruir onze anos depois. Será que devemos mandar às malvas o
marxismo-leninismo, no que respeita ao papel das massas, e acreditar que
foi mesmo a CIA e um grupo de traidores que deram cabo, em tão pouco
tempo, de um regime tão sólido como o soviético?
“A Revolução de Outubro projectou-se em todo o mundo determinando
grandes conquistas e avanços civilizacionais e libertadores para os
trabalhadores e para os povos”: esta é, talvez, a única verdade
existente entre a enxurrada de mentiras disparada por Jerónimo de Sousa.
Mas já foge à verdade quando acrescenta que, “no seguimento da
Segunda Guerra Mundial, foi ainda com o determinante papel da União
Soviética que se alterou profundamente a correlação de forças
internacionais, dando origem a uma nova ordem mundial que ficaria
consagrada na Carta da ONU”. Como é sabido, Estaline não libertou metade
da Europa do fascismo, mas substituiu esse jugo tenebroso por outro que
não lhe ficou atrás quanto ao terror e violência.
Depois de enumerar os problemas do capitalismo que todos conhecemos, o
dirigente do PCP continua teimosamente a insistir que “o futuro da
humanidade não reside na exploração, opressão, pobreza, injustiça e
guerra, mas sim na realização do sonho milenar do homem, na sua
libertação, na paz, no progresso social e na justiça – no socialismo e
no comunismo”.
Não nos venha com receitas velhas e promessas de que “nós não iremos
repetir os mesmos erros”. O resultado é sempre o mesmo. Por isso, não
nos venda mais mentiras, pois hoje é 7 de Novembro e não 1 de Abril.