
O Expresso desta semana publicou um livro muito bem feito, organizado por José Pedro Castanheira, sobre a Censura do Exame Prévio, antes de 25 de Abril de 1974, durante o tempo em que o jornal se publicou. Pouco mais de um ano porque o Expresso saiu em 6 de Janeiro de 1973.
Uma das histórias dessa censura de corte radical já foi contada pelo autor Castanheira, na tv, na Sexta-Feira passada. Trata-se da história do julgamento das Três Marias, cuja notícia a censura cortou. Era, aliás, uma história em segunda mão, contada originariamente pela revista Time, americana, mas com edição europeia.
O que conta Castanheira desse corte selectivo, mas radical? Que o texto noticiava a entrevista da Time às três escritoras e relatava brevemente o motivo do julgamento em curso, das Três Marias: o livro Novas Cartas Portuguesas, "Posteriormente considerado de conteúdo `insanavelmente pornográfico` e atentatório da moral pública" , conforme dizia o despacho de pronúncia.
Não está em causa contestar aqui a Censura existente no regime de Caetano. Era um facto e o livro do Expresso demonstra amplamente o carácter minucioso e cirúrgico das reservas que os censores impunham à liberdade de expressão.
Aqui está apenas em causa a natureza desta censura noticiada agora, à notícia de então.
A revista Time vendia-se livremente em Portugal. Já publiquei aqui um número posterior ao de 22 de Maio de 1973 a que se refere a notícia do livro do Expresso, bem mais subversivo para o regime de Caetano do que esse. E comprei-no na época, sem problemas.
Por outro lado, descobri agora um suplemento do vespertino de então, A Capital, de 17 de Maio de 1972, com uma página inteira consagrada ao livro das Três Marias ( clicar para ler algumas das cartas coligidas pelas Três Marias).
Sem dúvida, não aparecem as passagens mais picantes. Seriam necessariamente censuradas.
O que na altura, todavia, não acontecia só por cá. Na Inglaterra, eram proibidos por efeito de Censura, manifestações do género. E sobre este tema tórrido, veja-se por exemplo, o caso de Linda Lovelace...
Portanto, o assunto, aqui deve ser outro: em que medida a Censura, em Portugal se distinguia da existente noutras latitudes. Não é com este exemplo das Três Marias que é possível fazer o retrato impressivo de tal ambiente e respectiva circunstância. Por uma razão:
O livro Novas Cartas Portuguesas, saiu à rua num dia de 1972, vendeu-se aos milhares ( num mês foi-se a primeira edição de 3 mil cópias, segundo a Time de então. No entanto , para aferir o rigor da Time, convém dizer que a Flama indica 2 mil cópias da primeira edição , com metade vendidas ao fim de um mês...em Abril de 1972) e só algum tempo depois, por denúncia do jornal Época ( uma espécie de jornal oficial alternativo) foram as autoras processadas e julgadas, sendo essa a notícia.
No entanto, falta algo substancial a essa história e que a Flama de 17 de Maio de 1974 contava assim:
Como se pode ler, o tribunal absolveu as Três Marias, considerando que o livro não era pornográfico ou imoral. A sentença foi dada um pouco mais de uma semana depois do 25 de Abril de 74, a 7 de Maio.
O magistrado do MP, no decorrer das sessões, ainda antes do 25 de Abril, "num gesto raro", como conta a revista, já tinha pedido a absolvição. E conta ainda mais, ao dizer que o agente da Polícia Judiciária que interrogou as três Marias, teria dito ás mesmas: " Eu sei que foi apenas uma das senhoras quem escreveu essas partes. E até sei qual foi. Mas uma vez que ela se recusa a confessar, fica com a sua consciência. Irão as três a tribunal". E foram.
Quanto à natureza verdadeira da Censura da época, uma das Três Marias, no artigo da Time de 5 de Novembro de 1973, dá uma imagem muito mais aproximada que o livro de Castanheira . As provas deste, simplesmente provam demais:
"Como todos os autores em Portugal, os seus escritos tem de passar pelo censor. Mas elas ( as Três Marias) dizem que não há viglância constante da polícia sobre elas. `Em Portugal não é assim. A repressão não é aberta ou ofensiva. É mais subtil. Estamos um pouco ameaçadas mas não corremos qualquer perigo`, dizia Isabel Barreno à revista.
Pensando bem, não faz grande diferença dos dias de hoje. Nesse aspecto particular, note-se.
Uma das histórias dessa censura de corte radical já foi contada pelo autor Castanheira, na tv, na Sexta-Feira passada. Trata-se da história do julgamento das Três Marias, cuja notícia a censura cortou. Era, aliás, uma história em segunda mão, contada originariamente pela revista Time, americana, mas com edição europeia.
O que conta Castanheira desse corte selectivo, mas radical? Que o texto noticiava a entrevista da Time às três escritoras e relatava brevemente o motivo do julgamento em curso, das Três Marias: o livro Novas Cartas Portuguesas, "Posteriormente considerado de conteúdo `insanavelmente pornográfico` e atentatório da moral pública" , conforme dizia o despacho de pronúncia.
Não está em causa contestar aqui a Censura existente no regime de Caetano. Era um facto e o livro do Expresso demonstra amplamente o carácter minucioso e cirúrgico das reservas que os censores impunham à liberdade de expressão.
Aqui está apenas em causa a natureza desta censura noticiada agora, à notícia de então.
A revista Time vendia-se livremente em Portugal. Já publiquei aqui um número posterior ao de 22 de Maio de 1973 a que se refere a notícia do livro do Expresso, bem mais subversivo para o regime de Caetano do que esse. E comprei-no na época, sem problemas.
Por outro lado, descobri agora um suplemento do vespertino de então, A Capital, de 17 de Maio de 1972, com uma página inteira consagrada ao livro das Três Marias ( clicar para ler algumas das cartas coligidas pelas Três Marias).

O que na altura, todavia, não acontecia só por cá. Na Inglaterra, eram proibidos por efeito de Censura, manifestações do género. E sobre este tema tórrido, veja-se por exemplo, o caso de Linda Lovelace...
Portanto, o assunto, aqui deve ser outro: em que medida a Censura, em Portugal se distinguia da existente noutras latitudes. Não é com este exemplo das Três Marias que é possível fazer o retrato impressivo de tal ambiente e respectiva circunstância. Por uma razão:
O livro Novas Cartas Portuguesas, saiu à rua num dia de 1972, vendeu-se aos milhares ( num mês foi-se a primeira edição de 3 mil cópias, segundo a Time de então. No entanto , para aferir o rigor da Time, convém dizer que a Flama indica 2 mil cópias da primeira edição , com metade vendidas ao fim de um mês...em Abril de 1972) e só algum tempo depois, por denúncia do jornal Época ( uma espécie de jornal oficial alternativo) foram as autoras processadas e julgadas, sendo essa a notícia.
No entanto, falta algo substancial a essa história e que a Flama de 17 de Maio de 1974 contava assim:

O magistrado do MP, no decorrer das sessões, ainda antes do 25 de Abril, "num gesto raro", como conta a revista, já tinha pedido a absolvição. E conta ainda mais, ao dizer que o agente da Polícia Judiciária que interrogou as três Marias, teria dito ás mesmas: " Eu sei que foi apenas uma das senhoras quem escreveu essas partes. E até sei qual foi. Mas uma vez que ela se recusa a confessar, fica com a sua consciência. Irão as três a tribunal". E foram.
Quanto à natureza verdadeira da Censura da época, uma das Três Marias, no artigo da Time de 5 de Novembro de 1973, dá uma imagem muito mais aproximada que o livro de Castanheira . As provas deste, simplesmente provam demais:
"Como todos os autores em Portugal, os seus escritos tem de passar pelo censor. Mas elas ( as Três Marias) dizem que não há viglância constante da polícia sobre elas. `Em Portugal não é assim. A repressão não é aberta ou ofensiva. É mais subtil. Estamos um pouco ameaçadas mas não corremos qualquer perigo`, dizia Isabel Barreno à revista.
Pensando bem, não faz grande diferença dos dias de hoje. Nesse aspecto particular, note-se.