sábado, julho 23, 2011

O cancro do Estado Velho

Sol:

Nas próximas semanas, o Governo irá dedicar-se à nomeação de centenas de gestores para as administrações de cerca de 40 empresas do Estado cujos mandatos actuais já terminaram, apurou o SOL. Além disso, é preciso tratar da nomeação de mais de 1.200 dirigentes superiores na Função Pública.

O Executivo de Pedro Passos Coelho já começou a fazer as suas escolhas para ocupar os cargos livres. E o tiro de partida das nomeações é dado hoje com a nomeação da nova equipa que vai liderar a Caixa Geral de Depósitos (CGD).

Tal como o próprio pretendia – e sugeriu ao accionista Estado – o actual CEO, Faria de Oliveira, passa a chairman, num novo modelo de governo bicéfalo do banco estatal. A presidência executiva é entregue ao até agora vice-governador do_Banco de Portugal, José de Matos. À semelhança do ministro das Finanças, o novo líder da CGD destaca-se pela competência técnica e não pelo perfil político.

Para vice-presidente da instituição financeira é indicado Nogueira Leite, actual conselheiro do primeiro-ministro e ex-secretário de Estado independente no Governo socialista de António Guterres. Os restantes membros da equipa eram ainda desconhecidos à hora de fecho desta edição.

A partir de agora, alguns dos ‘tronos’ mais cobiçados são os da ANA, CTT, AdP, AICEP e do regulador das comunicações ANACOM. As nomeações mais urgentes são as das Estradas de Portugal, CTT e AICEP, uma vez que os seus presidentes já abandonaram o cargo.

A ANA e os CTT são duas empresas que o Governo irá privatizar nos próximos tempos. Nestes casos, segundo Pedro_Rebelo de Sousa, presidente do Instituto Português de Corporate Governance, a nomeação deve cumprir critérios específicos.

«Devem ser nomeados gestores que tomem medidas para colocar a empresa à venda ou então deve-se dar continuidade à actual gestão para esta finalizar o seu trabalho», defende o advogado.

No caso dos CTT, a hipótese de ser nomeado um grupo de gestores ganha força, pois actualmente apenas resistem três dos cinco elementos da administração e a saída do actual presidente provisório, Pedro Coelho, com 71 anos, é praticamente certa. «Tenho de perguntar à minha mulher antes de decidir se fico», disse ao SOL o gestor, em tom animado.

De saída também deverá estar o presidente da ANA, Guilhermino Rodrigues. Ex-governante socialista e um dos homens fortes da máquina do partido, não deverá ser reconduzido pelo actual Executivo. A sua nomeação para o cargo – envolta num coro de críticas por parte dos comentadores e da oposição política, no início de 2005 – foi uma das primeiras efectuadas pelo então recém-eleito primeiro-ministro_José Sócrates.

A luta pelo controlo da AICEP – Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal também se antevê renhida. O primeiro round foi travado durante a formação do Governo, com a tentativa do líder do CDS-PP, Paulo Portas, de tentar puxar a agência para o seu ministério dos Negócios Estrangeiros a ser bloqueada por Passos Coelho. O chefe do Governo quer comandar aquele que tem sido um dos veículos do Estado mais importantes na promoção externa das empresas nacionais. O antigo presidente, Basílio Horta, abandonou o cargo para ser deputado do PS.

Na ANACOM, Amado da Silva está de saída, pois não pode renovar, por lei, o seu segundo mandato. Este cargo deverá ser ocupado por uma personalidade com um percurso académico e empresarial reconhecido no sector das telecomunicações.

Nomeações políticas podem acabar

Por cumprir está ainda a tarefa de substituir os 1.211 dirigentes superiores da administração do_Estado, nomeados pelo anterior Governo. Passos Coelho pretende acabar com este método de ocupação dos cargos, garantindo espaço à abertura de concursos públicos.

«O essencial é estabelecer critérios para a ocupação destes cargos: formação, credenciais, experiência, entre outros», sugere Rebelo de Sousa. «Estes processos devem assegurar que todos os cidadãos beneficiem de igualdade de oportunidades e todas as nomeações devem ser justificadas à população».

O SOL sabe que o Governo já começou a contactar algumas empresas de recrutamento – nomeadamente head hunters – para encontrar perfis adequados aos lugares disponíveis.

«Acho muito bem, desde que os critérios sejam transparentes e que sejam contratadas três ou mais empresas para garantir a pluralidade», observa Rebelo de Sousa, que sugere ainda que cada ministro seja obrigado a elaborar, anualmente, um relatório sobre as nomeações por si efectuados, «distinguindo as nomeações que resultaram de um processo de pré-selecção e as que resultaram de escolhas pessoais suas».

No Estado Novo, por imposição de Salazar, os gestores públicos não podiam ganhar mais que um ministro, o que ficou definido em 6 de Junho de 1960 através da Lei 2105. Em 13 de Setembro de 1974, Vasco Gonçalves através do Decreto- Lei 446/74, limitou esses mesmos vencimentos dos gestores públicos ao salário máximo de 1,5 vezes o vencimento de um Secretário de Estado.

Tais medidas, simples, correctas, coerentes e justas, se aplicáveis nos dias de hoje aos magníficos gestores que se acotovelam ( é um modo de dizer, porque na verdade se devoram) para alcançar os melhores lugares, teriam um efeito duplamente útil: poupariam milhões e contribuiriam mais do que muitas outras para uma moralização do país que se torna imprescindível para mudar de rumo.

Questuber! Mais um escândalo!