sexta-feira, outubro 28, 2011

Costa Andrade em mais uma lição de direito penal substantivo

No Público de hoje, este artigo do penalista de Coimbra, Costa Andrade merece leitura e comentário rápido.
No seu habitual estilo algo rebuscado nas citações mitológicas, Costa Andrade atira-se aos três projectos para a futura lei sobre o enriquecimento ilícito. Começa por dizer que acompanhou o processo das conceptualizações sobre o assunto, "com expectativas favoráveis", seja lá isso o que for. E depois de ter escrito que entende tal futura lei como espúria "como se a lei de que dispomos não oferecesse já os pressupostos normativos bastantes para enfrentar e punir os corruptos e a corrupção.", começa a depenar os três projectos conhecidos, o do BE, o do PCP e o do PSD/CDS. E deixa-os em fanicos.

Assim, dos três projectos conhecidos nenhum deles serve a ideia académica de Costa Andrade sobre o assunto. O pior será o do BE, que incrimina e pune a "posse ou título de património e rendimentos superiores aos apresentados nas respectivas e prévias declarações." Portanto, o BE pretende punir a "dissonância entre o património e a declaração anterior", o que causa dificuldades graves de enquadramento no normativo correcto que é o da corrupção. Afinal com esse projecto temos um outro crime de falsificação...e com um perigo à espreita: basta que o putativo corrupto tenha declarado um rendimento empolado anteriormente para se livrar da tal "dissonância". De facto, a esperteza dos técnicos- juristas do BE parece lendária.
O do PCP afina pelo mesmo diapasão com um acrescente de monta:para além da tal "dissonância" é necessário que o agente indiciado justifique o que ganhou e como o obteve. Um descalabro constitucional, que deixa o ónus da prova a cargo do indiciado.
O projecto do PSD/CDS também não logra os favores do penalista de Coimbra: mais prolixo e complexo, esbarra em conceitos indeterminados a eito como o "incremento significativo do património", " que não possam ser razoavelmente justificados" e a "manifesta desproporção" e outras expressões que minam fatalmente a inteligibilidade e a determinabilidade que deveriam permitir distinguir o lícito do ilícito.
Portanto, três projectos pró-lixo.

Mas o comentário escrito de Costa Andrade peca por uma coisa bem simples: a crítica só pela crítica para quem é perito no assunto deixa muito a desejar. Costa Andrade escreveu logo no início que acompanhou o assunto com "expectativas favoráveis", mas acabou frustrado nas mesmas. E como é que Costa Andrade proporia uma redacção adequada para o crime? Ser-lhe-á muito difícil elaborar um pequeno texto coerente com os princípios e doutrina penal que ensina em Coimbra?
Será, Herr Professor? Ou na galeria de figuras mitológicas que enuncia, prefere anichar-se na figura duvidosa de Cassandra?

Então aqui vai uma opção de um diletante do Direito. Assim: enquadrar o ilícito como um crime de perigo abstracto ( o tal risco na actividade pública e política, presumido) e ao mesmo tempo, aferido ao concreto do resultado, passível de análise a posteriori em prognose póstuma e com a faculdade de se poder comprovar ou não. Ou seja aferindo o tal risco ao caso concreto e aos motivos do enriquecimento.
Há quem chame a estes crimes como sendo de perigo abstracto-.concreto.

Estou convencido que esta formulação evitaria as armadilhas do ónus da prova.

Questuber! Mais um escândalo!