terça-feira, abril 10, 2012

Isto é do caneco: a busca de um calcanhar de Aquiles

InVerbis, citando o i de hoje:

O Conselho Superior da Magistratura (CSM) não recebeu qualquer queixa para averiguar se o juiz Carlos Alexandre violou o dever de reserva dos magistrados quando falou sobre o contexto de uma diligência processual numa entrevista dada ao blogue "Ânimo". Mas hoje é dia de reunião plenária no CSM e algum membro pode invocar a questão.

Estas linhas transcritas do i de hoje vêm assinadas por Sílvia Caneco ( que me perdoe o irresistível trocadilho do título) e pretendem relançar uma lebre cansada que alguém lançou há muito tempo a correr nos media. Particularmente, em finais de 2009, altura que o juiz de instrução do TCIC, Carlos Alexandre se preparava para instruir os processos do BPN, submarinos e "furacão".
Na altura ( 10.1.2010) o Expresso noticiava a putativa preocupação de algumas personalidades com a circunstância de aquele juiz provocar "alguma controvérsia, pela forma como aprofunda e se empenha nos processos ( em demasia, segundo alguns advogados de defesa) e por dar luz verde a algumas diligências mal recebidas ( buscas a escritórios de advogados)".
A solução para as preocupações desses preocupados ( entre os quais o presidente do STJ que respondeu secamente ao Expresso que não respondia sobre o assunto) seria encontrar um parceiro pensador para os processos do TCIC. Problema: não havia ( nem há agora) processos atrasados no tribunal. Azar para os preocupados...
Nesse artigo, o Expresso não se coibia de escrever: "para já, o juiz não tem calcanhares de Aquiles".

Muito tempo antes, em 2003, no TCIC estava por lá uma juiza- Fátima Mata-Mouros, em tempos leitora deste blog. E numa entrevista extensa ao Público, em 17.11.2003, dizia coisas extraordinárias e interessantes, para o tempo.
Por exemplo que não lhe repugnava nada a realização de escutas em sede de pré-inquérito ( na PJ, portanto) e que " a escuta não deve ser eliminada enquanto a defesa não aceder a ela". Além disso, considerava então as burocracias com as escutas, transcrições e selecção do material escutado uma "carga burocrática lesiva do direito das pessoas."

As regras processuais mudaram em 2007, aumentando exponencialmente essa carga burocrática e nessa altura, em 2003, Fátima Mata-Mouros escrevera um livro sobre as escutas, com base na sua experiência no TCIC, no qual conclui, além do mais, isto:

Entre as opiniões que os tais "preocupados" com o caso do TCIC tinham avultava o de este tribunal centram ser presidido apenas por um juiz de instrução ( como aliás o é o caso do controlo de escutas a outros titulares de órgãos de soberania, pelo pSTJ) . Citava-se então útil e precisamente Fátima Mata-Mouros que tinha elaborado um relatório a propor um segundo juiz para o cargo. Um relatório que caiu como sopa no mel para os preocupados ao qual se agarraram como tábua de salvação mediática. O azar é que não havia razões processuais e de movimento que justificasse a solução...
Desconhece-se o que a actual desembargadora pensa sobre o assunto mas pode sempre dizer algo, particularmente sobre mais esta ofensiva de "preocupados" com o actual juiz do TCIC que acumulou muito mais experiência que aquela e que se pudesse e quisesse escrever um livro sobre o que sabe deste nosso pequeno mundo nacional, seria best-seller. Daí as preocupações dos preocupados.

Desta vez, o aríete é o jornal i, através daquele artigo de Sílvia Caneco e do editorial do novel director do periódico, Eduardo Oliveira e Silva, muito versado nestas matérias e que perora em editorial sobre os malefícios da magistratura falar em público.
Sobre o video passado na TVI com Carlos Alexandre mostra-se pesaroso. Acha que as declarações prestadas "não abonam a credibilidade da justiça portuguesa e um dos seus principais protagonistas." Carlos Alexandre, note-se, citou essencialmente um ditado popular: " quando o dinheiro fala, a verdade cala-se". E citou alguém com nome na praça a falar em nome de quem tem dinheiro, muito dinheiro...
Terá sido este o motivo para tão grande pesar jornalístico e será este o motivo para tamanho desprestígio de um magistrado?

À boleia deste pesar sentido, apresta-se a Sílvia Caneco a sugerir ao CSM que na reunião de hoje ( que decorre), debata o assunto. Sílvia Caneco falou com o vice-presidente do CSM e este não se mostrou preocupado porque os verdadeiros preocupados são outros. Sílvia Caneco saberá quem são e então o director do jornal ainda saberá melhor.

Para tranquilizar tanta preocupação, lembro aqui uma entrevista do mesmo juiz ao Correio da Manhã de 27.12.2009, na revista-anuário do jornal, em que essencialmente já dizia o mesmo que agora: nunca pertenceu a nenhuma agremiação, leia-se maçonarias e quejandas.
Nesta parte da entrevista dá-se conta do controlo que diversas instâncias exercem sobre o juiz. São muitas e de muitos preocupados. Alguns deles, naturalmente e por causa dessas preocupações procuram assento no órgão de disciplina e gestão dos juízes, o CSM. E de vez em quando mostram essa preocupação de forma ostensiva. Uma das últimas vezes que o fizeram foi a propósito de um caso singular, a classificação de serviço de um outro juiz que os preocupou em demasia, Rui Teixeira.
Quanto aos demais juízes e magistrados que participam em debates televisivos semanais, escrevem opiniões em jornais ( como António Cluny o faz habitualmente no mesmo jornal i) e peroram sobre assuntos de informações da República ou jurídicos, em seminários, encontros públicos e conferências, esses nunca os preocuparam. Nem preocuparão. Por natureza esses não têm calcanhares de Aquiles, nunca violam deveres de reserva ( nem o presidente do STJ quando se pronuncia sobre casos concretos judiciais e pendentes) e é por isso que esses preocupados andam afadigados em encontrar um calcanhar de Aquiles que sirva ao juiz do TCIC.

Ainda não foi desta, pese embora o esforço do caneco ( sorry, é irresistível) e a hipocrisia do director do jornal. Este tem um currículo de preocupações invejáveis:
"Eduardo Oliveira Silva tem desempenhado até agora o cargo de Director do Centro de Formação da RTP. Anteriormente, tinha sido director de informação da RDP, director-adjunto, chefe de redacção e assessor da administração. Entre 1988 e 1993 foi, sucessivamente, director de informação e presidente da Agência Lusa."
Percebe-se muito bem de onde lhe vêm os motivos de preocupação e por isso veremos futuramente mais reflexos desse jornalismo cívico feito de empenhos.
Então a minha preocupação singela e de simples blogger é esta: poderá Eduardo Silva esclarecer os leitores a que loja maçónica pertence ou pertenceu? Se não pertenceu a nenhuma tem apenas uma resposta a dar: precisamente a que o juiz Alexandre deu. Será capaz? Ou entende tal como um desprestígio para a classe?


4 comentários:

Floribundus disse...

todos sabemos que os interessados 'pagam' as notícias e como pagam.

hajapachorra disse...

Bem visto. Esse é um dos quatro calcanhares de Aquiles dos 'jornalistas' e directores de erretepes...

Rui disse...

José,
para mim o que está a fazer e a escrever neste post é verdadeiro serviço público.

Coloque para aí um NIB que eu pago para ler o seu blogue,pois vale bem mais a pena que o euro que custa o i:)

Cumprimentos

josé disse...

Não posso cobrar por algo que preciso de fazer para me desanuviar e espírito.

Só temo a tentação da parrésia. Tenho que me refrear, porque ouvir uma mentecapta, ontem, na A.R. a dizer que as ilegalidades que praticou e lesaram o erário público em milhões, "foram uma festa" apetece sei lá o quê...

O Público activista e relapso