Santana Castilho escreve hoje no Público uma crónica em que relata um conto que leu num livro de Françoise Giroud ( que foi directora do L´Éxpress quando valia a pena ler este semanário francês, nos anos setenta):
"Quando Chamberlain compreendeu que não era o primeiro-ministro adequado a liderar o Reino Unido em guerra, escolheu, ele próprio, como era tradição no partido conservador inglês, o seu sucessor. Designou lorde Halifax. Mas Chamberlain queria um governo forte e sabia, por isso, que era indispensável que Churchill fizesse parte do elenco. Convocou-o e disse-lhe:-Halifax é
Churchill, por patriotismo e por dever, por essa autêntica grandeza que é a abnegação face a um interesse superior, disse que sim.Horas depois, um homem que tinha taleno. Lorde Beaverbrook, magnata da imprensa inglesa, pdeiu a Churchill para o receber com urgência e disse-lhe:
-Não é possível! Aceitou que seja Halifax o primeiro-ministro?
Churchill respondeu que se tratava de um negócio de Estado e que não iria discutir com ele. Beaverbrook insistiu. Churchill respondeu que não tinha outra saída. E Beaverbrook voltou à carga:
- É um crime contra a Nação! Só você poderá mobilizar a Grã-Bretanha.
No fundo, Churchill concordava com Beaverbrook. Mas objectou que tinha dado a sua palavra e que não voltaria atrás. Então, Beaverbrook disse:
-Peço-lhe pelo menos uma coisa. Quando for convocado por Chamberlain, com Halifax, e Chamberlain lhe perguntar se confoirma a sua aceitação, fique em silêncio durante três minutos. Três minutos completos. Cento e oitenta segundos, antes de dizer sim. Em nome da Inglaterra, peço-lhe.
Churchill achou isto impertinente e não viu como isto poderia mudar a situação. Mas, como tinha amizade e estima por Beaverbrook, prometeu-lhe que o faria.
No dia seguinte, Churchill e Halifax encontraram-se no gabinete de Chamberlain, na Downing Street.Chamberlain pediu a Churchill:
-Pode confirmar , se faz favor, a lorde Halifax, que aceita fazer parte do seu Governo?
E Churchill ficou calado. Passou um minuto, e Churchill continuava em silêncio. Minuto e meio depois, Churchill permanecia em silêncio. Ainda não tinham transcorrido os três minutos, lorde Halifax não aguentou, exclamou e saiu:
Creio que é Winston Churchill que deve ser o primeiro-ministro!
O mínimo que se poderá dizer é que estes três minutos tiveram um papel da máxima importância na história da Segunda Grande Guerra Mundial. "
Em Portugal, actualmente, não há oportunidade para estas situações dramáticas se desenvolverem. O actual primeiro-ministro não só quer continuar como permanece arreigado ao estilo, modo e poder de actuação dos últimos anos que foram trágicos para a vida dos portugueses.
Não deveriam existir muitas dúvidas que a gravamento súbito das condições da dívida pública portuguesa em 2009, teriam obrigado a uma inflexão de políticas que poderiam ter salvado o país desta hecatombe que é a de pedir empréstimos avultadíssimos e juros usurários de 6% e que não poderemos pagar, certamente. O país está por isso mesmo em bancarrota e os bancos podem falir. Será a desgraça total e a ruína de todos nós.
Culpados estruturais haverá muitos, mas na conjuntura há só um bem visível e que merece ser responsabilizado directamente pelo que fez: este Inenarrável que governa. Não é apenas um bode expiatório mas o fazedor da desgraça, em concreto e sem dúvidas de maior, para quem quiser ser politicamente honesto.
Em 2009, o presidente da República poderia ter intervindo e parar a sangria. Não o fez por medo de perder a eleição presidencial. Em Junho de 2009, o país poderia ter ficado a saber que este primeiro-ministro andava a tentar comprar vários órgãos de comunicação social, para manipular a informação como acontece actualmente na TVI, com a tomada de poder pelo inefável conde. O país saberia tal coisa se porventura fosse instaurado inquérito por atentado ao Estado de Direito. Bastaria que o processo fosse autuado na secção criminal do STJ como deveria e as coisas seguiriam o seu curso normal.
O actual PGR e o presidente do STJ, objectivamente conluiados num entendimento espúrio do direito e do processo penal que temos, eventualmente em pânico por temerem que tal coisa se soubesse em período de campanha eleitoral, salvaram o primeiro-ministro desse embate com a opinião pública. Os magistrados de Aveiro e a PJ, profissional e honradamente mantiveram o segredo de justiça que se impunha. Alguém, no dia 24 de Junho informou certos arguidos que andavam a ser escutados e depois disso mudaram de conversa. E não foram certamente os magistrados de Aveiro...
Esse facto corresponde ao silêncio de Churchill, mas ao contrário: em vez de sigilo houve violação do mesmo e eventualmente por alguém que tinha interesse directo em avisar amigos políticos. E houve um silência prolongado sobre o assunto que durou até bem depois das eleições legislativas desse ano. Um silêncio que foi de ouro e resultou em cheio.
Não se sabe nem se descobriu ainda quem foi o autor da gravíssima violação de segredo de justiça que obviamente pede prisão efectiva. Há um inquérito a decorrer e nada se sabe do mesmo. Nem sequer onde está actualmente.
O actual PGR disse numa entrevista que os processos criminais em Portugal que envolvem políticos são geralmente processos políticos que "não dão em nada" e por isso mesmo o afirmou.
Sintomaticamente a actuação dessa autoridade do MºPº nessa altura, foi o que salvou politicamente o primeiro-ministro de ser confrontado em plena campanha eleitoral com um facto gravíssimo que atentava contra o Estado de Direito.
Ninguém sabe ou pode dizer qual seria a consequência política de tal revelação que necessariamente ocorreria se o processo seguisse o curso normal e rápido porque os factos assim o exigiam e havia sido requerido pelos magistrados de Aveiro.
Mas toda a gente percebe a consequência de se ter arquivado o expediente e mandado destruir as escutas fortuitas: o maior golpe na credibilidade na Justiça de que há memória, desde sempre, em Portugal. Não há exemplo sequer, para se lhe comparar.
Ao contrário de Churchill, foi esse silêncio de alguns meses no Verão de 2009 que ditou a nossa bancarrota, provavelmente.